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Cadernos

As recordações do antigo “Kunst Puwe Mill” que marcou época em Herval

11/05/2020 - 19h07min

Rudi olha para o desenho do antigo moinho e se recorda das histórias vividas (FOTO: Cleiton Zimer)

Santa Maria do Herval – Aos 80 anos, seu Rudi Kunst mora no Centro e passa parte dos seus dias desenhando, pintando ou escrevendo um livro sobre a sua história e do município.  Sua arte emana de um passado vivido com intensidade, sendo testemunha ocular do desenvolvimento do Teewald, contribuindo para a constituição da história, sendo professor, contador, dando orientações para o desenvolvimento do agronegócio e, inclusive, foi um dos responsáveis por implantar a avicultura no Herval. Teve também vários outros ofícios, como conhecimentos veterinários muito requisitados na época.

Rudi nasceu em 17 de novembro 1939 na Vila Kunst, onde estava situado o antigo Moinho Kunst, conhecido na época como “Kunst Puwe Mill”, cujas atividades começaram em 1939 e se estenderam até meados de 1970. Lá moravam duas famílias na mesma casa: os irmãos Arthur e Aloysio Kunst, casados, respectivamente, com as irmãs Blandina e Elza Meurer.

Rudi não tem registro fotográfico do moinho mas desenhou-o

Seu Rudi é o filho mais velho de Arthur e Blandina, que tiveram outros três filhos. Já Aloysio e Elza tiveram 11 filhos. “Cada um era responsável por algo. Meu pai e minha mãe cuidavam do moinho, enquanto os tios Aloysio e Elza se encarregavam da roça, plantavam e cuidavam dos animais. Era tudo meio a meio”, afirma Rudi.

Rudi começou a ir na escola aos seis anos com o professor Vicente Führ. “Depois vieram as freiras da Nossa Senhora Aparecida, e estudei com elas da segunda até a quarta série, até meus 10 anos. Aí uma irmã me disse que eu deveria ir para um colégio grande, para ser um futuro homem do Herval”, lembra Rudi.

Assim, em 1951, fez a admissão para o Ginásio no Colégio Marista São Jacó, onde hoje fica o Campus I da Universidade Feevale, em frente ao Hospital Regina em Novo Hamburgo, que posteriormente incendiou. Após o incêndio, em metade de 1954, foi para o Colégio Marista São Luiz, em São Leopoldo.

“Aí meus pais venderam em Herval e vieram para Novo Hamburgo por causa de mim”, lembra. Rudi então começou a estudar contabilidade, técnico e científico durante a noite, e, ao longo do dia, trabalhava nos Calçados Adam, como chefe da sessão de cálculos. Ele estudou até julho de 1957, pois voltou para o Herval para dar aula. Mesmo assim, no final daquele ano prestou exames e foi aprovado.

Usando a arte de ensinar para garantir a prosperidade do povo

Rudi conta que quando voltou ao Herval para Lecionar, na metade de 1957, fez a sua primeira escolinha na Vila Kunst, que na época pertencia ao município de São Leopoldo. “Tinha uma casa que estava desocupada, onde depois morou o Pedro Backes. Com a ajuda dos pais e colonos, colocamos alguns bancos feitos de pontas de pranchão e por cima tábuas de pinho e instalamos um quadro”, lembra ele.

A escola era pequena – seis metros por cinco – mas cabiam 40 ou mais crianças e era unidocente, ou seja, tinha alunos da primeira até quinta série, tudo na mesma sala. “Dei aula durante meio ano e, no final, a coordenadora de ensino acompanhada da prefeita veio para prestar os exames, que foram feitos de forma oral e algumas coisas no quadro. Os estudantes tiveram 89% de aprovação, com distinção”, lembra Rudi.

Rudi em pé, a direita, junto com seus alunos da Escola Padre José de Anchieta da Vila Kunst prontos para o desfile de 7 de Setembro (FOTO: arquivo pessoal)

Em 1958 começou a dar aula em Padre Eterno, mas lá tinha menos alunos. Posteriormente, passou a lecionar na escola da Vila Kunst que está localizada entre a Igreja (que está em construção) e o salão da comunidade e, também, em Brizoletas locais. Em meados de 1961, durante a noite, passou a dar um curso de técnicas agrícolas, avicultura e conhecimentos gerais junto com Lotário Acker onde hoje fica o Colégio Cônego Afonso Scherer. Os cursos eram fornecidos de forma gratuita. Para se locomover entre uma escola e outra, usava sua moto Jawa. “Além disso, na sociedade do Centro eram feitos ensaios de teatro”, recorda Rudi.

Rudi lecionou até 1971 em Santa Maria do Herval. Depois disso foi morar em Lomba Grande, Novo Hamburgo, onde usou dos seus conhecimentos para contribuir com o desenvolvimento do agronegócio local. “Através de amostras de solo e a readequação conseguimos melhorar a produção de mandioca que, no quinto ano, chegou a 11 mil quilos. Depois disso, investimos em melhoramento genético do gado”, contou.

Ele recorda que fez a primeira cesariana em uma vaca na Expointer, em 1978. “Tudo o que aprendi foi com o técnico e científico, que era muito completo na época”, ressalta.

Rudi também se cassou com sua esposa Mirian Kassel (em memória). Juntos tiveram três filhos, mas, além desses, Rudi conta que tem outros filhos de coração, cujas pessoas acolheu como se fossem seus próprios filhos.

O fatídico 4 de julho

Rudi recorda que na época o moinho Kunst era famoso. “Tudo vinha a cavalo, carroças, desde Padre Eterno, Renânia, Boa Vista e São José do Herval. Até caminhões da Prefeitura de São Leopoldo traziam e levavam coisas”, conta. “Vinham cargas de farinha, milho, arroz, erva mate e óleo”.

Ele conta que seus pais até chegaram a fazer um quarto no moinho para que não precisassem sair no inverno, pois funcionava 24 horas por dia. Enquanto isso as crianças ficavam com os tios.

Mas um dia frio de 4 de julho de 1947 ficará marcado para sempre na memória de Rudi. “Eu tinha sete anos, sempre ajudava meu pai e sabia como o moinho funcionava, então ele me pediu para ver como estava. Cheguei lá e vi que o cilindro que peneirava o milho estava parado. Quando me abaixei para arrumar, o eixo que estava girando pegou meu braço e, em menos de um segundo o arrancou fora”, lembra Rudi.

Uma vizinha Schnek que casualmente estava lá os orientou a colocar uma concha de banha em cima, para estancar o sangue. “Depois chamaram o Laurilo Fleck, que era um dos únicos que tinha um automóvel Ford 39 para me levar ao hospital. Aí pensei: é hoje que vou andar de carro. Até esqueci do que tinha acontecido”, brincou.

Introduzindo a avicultura no Herval

Rudi Kunst tem 80 anos e possui uma vasta história com Santa Maria do Herval (FOTO: Cleiton Zimer)

Hoje o setor primário é responsável por 50% da arrecadação do município de Herval e, disso, boa parte está diretamente relacionava à avicultura. Mas para que isso fosse possível foi necessário que alguém tivesse essa visão empreendedora no passado, e esse alguém foi seu Rudi, junto com o irmão Miguel do Colégio Cristo Rei.

“Em Porto Alegre, o dono da Varig (Viação Aérea Rio-Grandense) Rubem Berter estava trazendo matrizes de frangos da Olanda e França, pois serviam a carne nos voos. A gente esteve lá para ver e nos disseram que era muito importante introduzirmos isso no Rio Grande do Sul; naquela época só tinha frangos comuns, aqueles do interior”, lembra Rudi.

Dessa forma, em 1961 Rudi comprou 800 ovos e uma chocadeira que instalou no porão da sua casa. “Lembro até hoje que, desses, 756 pintinhos eclodiram”, conta, afirmando que esses foram os primeiros frangos que vieram para o Herval. “Hoje digo que a gente deve tudo isso que temos no setor para o Rubem Berter e ao irmão Miguel”, ressaltou.

Rudi conta que deu cursos sobre a avicultura para muitos futuros empreendedores do ramo. “Os Wallauer e os Müller da Lebon assistiram aulas aqui comigo, depois disso começaram a Frango Sul em Montenegro”, conta.

 

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