Região
Santa Maria do Herval: andarilho ganha bicicleta e carrocinha para seguir na lida
Por Cleiton Zimer
Santa Maria do Herval – Você lembra do andarilho Daniel Armbrust, de 53 anos, que vive pelas ruas de Santa Maria do Herval e região? Foi feita uma reportagem sobre a história de vida dele em setembro, na qual contava que estava lutando para conseguir juntar um dinheirinho e comprar uma bicicleta, adaptá-la em uma carrocinha para poder continuar coletando suas latinhas e, com isso, quem sabe um dia, comprar seu cantinho para morar.
Na época da entrevista – que ocorreu no dia 20 de setembro –, ele estava com uma carrocinha de madeira, pesada e ao mesmo tempo pequena. Puxava-a com a mão, catando latinhas por onde conseguia para se sustentar.
Algumas pessoas se sensibilizaram com seu relato e começaram um movimento. Cada qual ajudou um pouco, da forma como podia; foi doada uma bicicleta, rodas, metal e telas. Foi paga manutenção e, alguém se dispôs a executar a mão de obra.
O pouco de muitos, mais uma vez, fez uma grande diferença. No início de dezembro Daniel passou pelo mesmo endereço onde foi entrevistado e, no local, algo lhe aguardava: uma bicicleta, especialmente feita para ele, adaptada com uma carrocinha leve e grande onde pode carregar muitas latinhas e outros materiais recicláveis para vender.
A reportagem não conseguiu conversar com ele depois disso. Mas, Daniel deixou seu agradecimento às pessoas o ajudaram sem que nem sequer tivesse pedido. “Acho que agora vou conseguir minha casinha”, disse, emocionado, ao pegar sua bicicleta.
O pouco de muitos fazendo a diferença
Contribuíram para a ação: Luis e Marcos Preus, Fábio Hoff, Paulo Moller, Paulo Mollinger, Metalúrgica Weber e Grupo Corrente do Bem. Quando a reportagem saiu muitas outras pessoas também pediram para ajudar.
Bicicleta, rodas e telas foram doadas, inclusive a mão de obra para fazer tudo. O restante, a manutenção da bicicleta – que inclusive foi reforçada com freios (dois na roda e um no pedal) e outros detalhes fundamentais para a segurança –, junto com os ferros que foram na carrocinha, resultaram no valor de R$ 470.
Este valor foi quitado junto às empresas que realizaram o trabalho. Caso alguém que tenha se oferecido para ajudar e não teve a oportunidade no primeiro momento, pode entrar em contato pelo 051 99323-6063 e fazer sua contribuição. O valor foi quitado por Paulo Moller, do Mercado Moller de Padre Eterno Baixo, e será direcionado para ele.
Relembre a história de Daniel
Daniel nasceu e cresceu em Três Coroas, onde morava com os pais, um irmão e uma irmã. A infância foi conturbada. Daniel relata que seu pai tinha problemas com álcool e frequentemente os filhos e a esposa eram agredidos por ele, sendo até mandados embora de casa. “Quantas vezes minha mãe fugiu do pai para ficar no irmão dela”, contou.
Já aos oito anos começou a trabalhar como engraxate. Saia de Três Coroas e ia até Canela, no Caracol, e passava o dia trabalhando; de noite voltava para casa.
Mesmo enfrentando todas as dificuldades na família a vida insistiu em ser ainda mais severa. Então em junho de 1982 a casa deles, que ficava na encosta de um rio, foi arrastada e destruída por uma enxurrada histórica.
Daniel tinha 14 anos na época. Depois da tragédia foi adotado por uma família conhecida em São Chico, no município de São Francisco de Paulo. Desde cedo teve que trabalhar pesado na lavoura, colhendo batatas e carregando os caminhões, além da lida nos matos de pinheiros. O trabalho árduo, porém, era feito sem garantias.
O serviço pesado ao longo dos anos lhe deixou sequelado, com várias hérnias pelo corpo, principalmente na parte intestinal. Também desenvolveu hidrocele – que é o acumulo de líquido dentro do escroto envolvendo o testículo.
Chegou a fazer cirurgias e não conseguiu mais voltar a trabalhar, com risco de alguma hérnia se romper. Para piorar não conseguiu auxílio-doença por parte do governo; conta que só ganhava atestados, mas nunca um laudo apontando sua inaptidão. Desta forma, há cerca de 10 anos se mudou para Parobé voltando a morar com dona Maria Francisca Armbrust, sua mãe.
Mas não durou muito tempo. Maria morreu logo em seguida, aos 75 anos. Ela pagava aluguel e, por não ter trabalho, não restou outra opção para Daniel do que sair de lá. Desde então, há nove anos, está na rua, sem moradia certa e enfrentando os desafios de cada dia para conseguir sobreviver.
Seu pai, Delmar Armbrust, 86 anos, ainda é vivo e está em um asilo em Parobé. Daniel não tem contato com os outros dois irmãos.
Daniel relatou que nunca passou por necessidades extremas. Sempre teve alguém para lhe dar comida, água, algum cobertor ou guarda-chuva. Conta que recebeu o primeiro carrinho em um marcado no Centro de Herval, o Kunst, e, desde lá, trabalha coletando latinhas. “As pessoas me dão lanches para comer”. Diz que quando não recebe comida e não consegue juntar dinheiro, têm lugares que o deixam comprar fiado e paga na sua próxima passagem.
“Pelas ruas, sou só eu e Deus. O mais importante é que ele sempre está comigo, 24 horas por dia, para onde eu vou”, diz Daniel, que aprendeu a ler na Bíblia.