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Educação: o que dizem os defensores e críticos à volta das aulas presenciais

13/08/2020 - 15h09min

Região – Atenção, pais: se tudo der certo, as aulas presenciais retornam no dia 31 de agosto. O “se tudo der certo”, neste caso, tem uma condição: as regiões do distanciamento controlado nas quais o Estado está dividido devem permanecer na bandeira laranja ou amarela. Isto abre um debate mais amplo, que não questiona o “quando”, mas “se” as aulas podem voltar nas atuais condições.

Há quem diga que 2020 é um “ano perdido” nos colégios, tanto para alunos, quanto para professores. Muitas escolas, inclusive da região, estão buscando se reinventar, com atividades à distância, lives, dia de busca e entrega de materiais na escola. À medida que o tempo vai passando, o rumor de um retorno pleno às aulas aumenta, o que preocupa especialistas.

Gabriel Grabowski, professor (Créditos: Divulgação/Universidade Feevale)

“Com 100 mil mortes e o vírus em expansão no Rio Grande do Sul, qualquer previsão de volta hoje é desaconselhada. O que deve ser acelerado são as providências e preparativos para equipar as escolas e propiciar aos educadores as condições de trabalho”, afirma o doutor em Educação e professor da Universidade Feevale, Gabriel Grabowski. De acordo com ele, há dificuldade da educação pública de migrar do ensino presencial para o virtual.

“Transpor aulas presenciais para diversas formas virtuais emergenciais não é EaD nem ensino hibrido. Ambas são modalidades próprias que exigem projetos pedagógicos e metodologias específicas”. O estudante Henrique Hub, 23 anos, mora no bairro Jardim Bühler, em Ivoti, e cursa bacharelado em Física no 3º semestre na Ufrgs. Na visão dele, não é possível, na atual conjuntura, um retorno às aulas presenciais.

“Primeiro, muitos professores são do grupo de risco, e depois, a universidade gera aglomeração. Têm muitos alunos e poucas salas”. Segundo o estudante ivotiense, nenhuma universidade deverá defender o retorno das aulas presenciais. “Seria uma negação da realidade”. Ainda assim, as aulas remotas não têm sido um problema para ele. O plano diretor da Ufrgs também definiu, recentemente, que não haverá cobrança de presença. “Posso assistir as aulas no momento que achar mais conveniente”.

“Com 100 mil mortes e o vírus em expansão no Rio Grande do Sul, qualquer previsão de volta hoje é desaconselhada”

As diferentes propostas para a retomada

A União dos Dirigentes Municipais de Educação do Rio Grande do Sul (Undime/RS) pede, em nota, que a retomada seja feita pelos níveis superiores, na seguinte ordem: Ensino Superior, cursos técnicos e profissionalizantes, Ensino Médio, anos finais e depois anos iniciais do Ensino Fundamental e pré-escola. Mas somente se houver condições sanitárias para tanto.

Em debate com a Famurs, que representa as associações de municípios, o governo do Estado trouxe uma proposta diferente, tanto para a rede pública quanto para o ensino particular: primeiro retornaria a Educação Infantil, depois o Ensino Superior, Ensino Médio e Técnico, anos finais e depois anos iniciais do Ensino Fundamental. Porém as conversas ainda estão no início.

Em todos os municípios gaúchos foram ou estão sendo criados os Centros Operacionais de Emergência em Saúde e Educação (COE-Es), no sentido de desenvolver eventuais estratégias de retorno às atividades escolares. São comitês específicos multidisciplinares, cuja função é debater, a partir dos níveis dos colégios, soluções para este retorno.

Na Amvarc, entidade que representa os interesses do Vale do Caí, a solução do Estado em voltar pela Educação Infantil foi discutida ontem no âmbito dos municípios. “Pedi para eles se posicionarem em relação ao assunto, e a maioria é contrária ao início pela Educação Infantil”, afirma a coordenadora da Amvarc e secretária de Educação de Linha Nova, Marli Schmitt.

Issur Koch, deputado estadual do PP (Créditos: Vinicius Reis/Agência ALRS)

Deputado fala em reinvenção do ensino

O deputado estadual, Issur Koch (PP), ligado à Educação, afirma que enxerga uma possibilidade de retorno, mas não de conclusão das aulas em 2020. “Mesmo que retorne, o ano letivo não se encerra em 2020. Até vejo uma possibilidade de retorno em 2021, cumprindo os protocolos, que vai ser um ano de muita importância para a construção curricular”, afirma ele.

Uma solução, segundo o deputado, deverá haver uma reinvenção do ensino neste período. “A sociedade terá de entender que o próximo ano será crucial para conseguirmos compilar dois anos em um, ou um ano e meio. A normalidade deve vir em 2022”, comenta ele, afirmando que o Legislativo tem papel de propor debates e intermediações entre os gestores e o governo.

“No momento em que o gestor nos diga que há condições de retornar, que cada um consiga garantir isto”

MP atento às recomendações de retorno

A promotora regional de Educação de Novo Hamburgo, Luciana Cano Casarotto, diz que o Ministério Público também acompanha de perto os debates sobre o retorno às aulas. “No presente momento, nos preocupa a questão sanitária, não tanto a data. No momento em que o gestor nos diga que há condições de retornar, que cada gestor consiga garantir isto”.

Luciana diz também que uma das bandeiras levantadas pelo MP é que o ensino seja facultativo, e não obrigatório. “Deve haver concomitância entre o ensino presencial ou remoto, para aquelas famílias que não se sintam confortáveis em levar seus filhos, e que elas também tenham garantido o estudo remotamente, como já vem acontecendo durante a suspensão das aulas”.

Sindicatos da Educação divergem sobre retorno

O Sinepe/RS, sindicato que representa o ensino privado, é favorável ao retorno. “Saudamos a possibilidade aventada pelo governo da volta às aulas ainda no mês de agosto, o que acreditamos ser uma medida correta. Com a retomada das atividades do comércio, da indústria e dos serviços é inevitável a necessidade do retorno das crianças à escola”, afirmou o Sinepe/RS, em nota.

O sindicato defende também que cada instituição possa definir quais estudantes devem retornar primeiro, “pois são elas quem melhor conhecem as necessidades de seus alunos”. A posição se dá porque, há dois meses, segundo o Sinepe, existe um protocolo para este retorno, e que já estaria sendo cumprido pela maioria das instituições da rede privada.

Helenir Schürer, presidente do Cpers Sindicato (Créditos: Divulgação/Cpers Sindicato)

A presidente do Cpers Sindicato, que representa a educação pública, Helenir Schürer, afirma que não considera 2020 um ano perdido. “Ainda há tempo de recuperar, ou, pelo menos, reorganizar o ano, avaliando aquelas disciplinas essenciais para o próximo ano letivo, para tentar trazer todos os estudantes no mesmo patamar de conhecimento”.

Para Helenir, a primeira questão a ser considerada em um eventual retorno é testagens em massa. “Você imagina receber alunos sem testes. Esta criança pode ser assintomática e infectar outras pessoas, ampliando a contaminação. O governo quer repassar aos COE-Es a responsabilidade para verificar a temperatura, mas isso é muito pouco, e não garante absolutamente nada”.

“O governo quer repassar aos COE-Es a responsabilidade para verificar a temperatura, mas isso é muito pouco, e não garante absolutamente nada”

A volta que pode aumentar os custos dos municípios

Relatório do Movimento Todos pela Educação diz que mesmo agora, o cenário é de crise nos municípios por causa da queda na arrecadação em razão da pandemia, e o retorno das atividades presenciais ocasionará custos adicionais. Despesas atuais são difíceis de ser arcadas com o cenário de queda na arrecadação de impostos municipais, mesmo em municípios grandes ou pequenos.

“Na prática, esta perda atual pode gerar uma dificuldade grande de pagar o salário dos professores em outubro, por exemplo, mas também de adquirir merenda, de organizar algumas ações de educação remota, e também de, eventualmente, conseguir colocar de pé o retorno às aulas”, afirma o coordenador de Relações Federativas do Todos pela Educação, Gustavo Wei.

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