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Entre perdas e ganhos: família de Ivoti terá Dia dos Pais marcado pelo coronavírus

07/08/2020 - 11h44min

Atualizada em 07/08/2020 - 11h45min

Seu José, Lúcia, Argeu, Alceu e Marcelo: retrato de uma família que busca superação (Créd. Alex Günther)

Ivoti – Na varanda da casa de José, na Morada do Sol, os filhos Argeu e Alceu lhe fazem companhia, aproveitando a manhã ensolarada. A esposa de Argeu, Lúcia, também participa da animada roda de conversa. A cena deveria ser extremamente comum em qualquer lar de uma família tradicional do município. Esta, não é.

O encontro é carregado de simbolismo e leva a reflexões sobre o real poder de uma doença que parou a humanidade. José Gottschalk, 75 anos, perdeu o filho Dirceu há poucos dias, vítima da Covid-19. O semblante resplandece a dor da perda, mas traz consigo o alento, por estar naquele instante na companhia de outros dois ex-pacientes da doença, que por 14 dias, ficaram entre a vida e a morte.

Argeu e Alceu enfrentaram o coronavírus praticamente juntos, vivenciando experiências similares simultaneamente, em locais diferentes. Neste domingo é celebrado o Dia dos Pais. A data não será completa para José, pai de sete filhos. Além da perda recente, a distância é um impeditivo para os demais herdeiros, que residem em outros estados.

Quatro dias sem saber o que aconteceu

Alceu foi o primeiro a ser diagnosticado com a doença. O operário da construção civil foi levado ao médico pelo irmão, Argeu, na noite do domingo, dia 5 de julho. Três dias depois, estava sendo internado no Hospital São José em Ivoti. “Ali já me intubaram e só acordei quatro dias depois, já hospitalizado na UTI do hospital de São Sebastião do Caí. Deste intervalo de dias, não lembro de absolutamente nada”, aponta.

Na unidade permaneceu por nove dias, sendo liberado para deixar o hospital e voltar para casa no dia 20, duas semanas após a primeira internação. Hoje, Alceu se sente parcialmente recuperado. Longas caminhadas lhe deixam com falta de ar. Para o trabalho, talvez não retorne tão cedo, já que conseguiu encaminhar sua aposentadoria. Sua esposa e enteada, uma adolescente de 14 anos, também foram infectadas, mas de acordo com Alceu, “casos leves que apenas levou ao isolamento”.

Momento de comoção quando Alceu deixou a UTI do hospital de São Sebastião do Caí

Mais um baque para a família

No dia seguinte à internação de Alceu, Argeu dava entrada no hospital. Horas depois de levar o irmão para a primeira consulta, ele passou a sentir os sintomas da doença. “Havia um forte calor na boca à noite. Ali já disse para a minha esposa dormir em outro quarto. A partir daquele momento comecei meu isolamento”, destacou Argeu.

A decisão gerou outra mudança na casa. O pai, José, teve de deixar a residência. Durante duas semanas se isolou na casa de outra filha, acompanhando através dos demais herdeiros a situação desesperadora dos dois filhos.

Argeu aponta que realizou o teste e teve de aguardar alguns dias. Durante o tempo, enfrentou sérias dificuldades com os ataques da Covid-19. “Meu filho estava em cima do resultado. É tudo muito demorado para quem passa por isso. Quando veio a confirmação, de imediato a Prefeitura mandou uma ambulância para me levar ao hospital. Eu sequer tive forças de entrar no carro”.

Em meio à luta, a perda

Entre idas e vindas, a triste notícia: a perda do irmão Dirceu. Prestes a completar 48 anos, ele era administrador de uma fabriqueta de calçados em Santa Catarina, empresa da família. “Ele deixou esposa e dois filhos. Nem pudemos ter um velório para nos despedir. Dói muito”, lamenta Argeu.

O morador já retornou ao trabalho na última segunda-feira, em um curtume de Estância Velha. Ele garante que não sente mais as sequelas da doença, apenas um cansaço natural pelo tempo de parada.

“Trocaria tudo para estar com meu pai”

Livre de sintomas da doença, mas vivendo intensamente em meio a ela no último mês, Marcelo, filho de Argeu comemora ter o pai em casa em um momento tão especial. O rapaz reflete sobre as lições que teve de assimilar, enquanto sua família passava por uma situação tão delicada. “Quando a pessoa passa por isso, percebe que mesmo tendo sucesso e dinheiro, nada importa quando quem você ama pode lhe deixar. Eu trocaria tudo para ter o meu pai do meu lado”, avalia.

Marcelo afirma que temeu perder o pai, no instante que encaminhou sua internação em Parobé. “Quando eu recebi os pertences do pai – roupas, documentos e até a aliança de casamento –  caí na real de quão sério era aquilo. As pessoas nunca acreditam na doença até acontecer com elas. Você muda a percepção das coisas quando se coloca na iminência da perda de alguém”, finalizou.

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