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Estanciense doa brinquedos guardados há mais de três décadas para a BM
Estância Velha – Quantos dias dura um carrinho ou um boneco para uma criança dentre três e oito anos de idade? E qual o significado de receber ou dar um presente para a geração de hoje?
Para a família do estanciense João Engelmann Netto, 79 anos, as definições para estas questões sempre estiveram relacionadas a medidas de valor, memórias e afetividade.
Mas a história da família Engelmann, e o exercício de dar significado emocional às coisas, por vezes tão simples, se tornou pública apenas na semana passada, quando seu João convenceu o filho de 45 anos, a desapegar-se de alguns bens que somavam mais de três décadas de conservação.
O gesto dos estancienses resultou numa caixa de carrinhos, bonecos, jogos e eletrônicos, que a família destinou à Brigada Militar (BM), para que a instituição revertesse em uma nova doação.
“Seu João Engelmann é conhecido na cidade, justamente por atitudes solidárias. Um membro, ativo, do Rotary Club. Esse gesto, de reunir verdadeiras relíquias da família e direcionar a nós, além de nos surpreender, nos colocou no compromisso de dar um destino correto aos brinquedos”, destacou o sargento da BM, Oséias Francisco Vieira.
O profissional disse que o estado de conservação dos brinquedos doados provocou a reflexão sobre a mudança de comportamento que vem acontecendo na sociedade, além de tornar o gesto do desapego, de solidariedade, ainda mais cheio de sentido.
“Hoje em dia, tanto as crianças não dão mais valor ao que ganham, até porque as coisas são mais descartáveis do que antes, quanto os pais parecem recompensar os filhos pela ausência, por meio de presentes. As coisas parecem não ter o mesmo valor”, ponderou Vieira.
Considerando o contexto da história, o sargento disse que a Brigada Militar decidiu destinar as doações, não diretamente às crianças da cidade, mas a uma instituição que pudesse ressignificar o uso dos brinquedos, por meio de atividades, além de manter a conservação.
A instituição escolhida foi a Casa do Ipê, de Estância Velha, que tem como proposta desenvolver atividades como a dança, teatro, contato com a natureza, educação socioemocional, entre outras, voltadas a crianças e adolescentes dentre dois e 17 anos.
Ressignificar
Mesmo não tendo combinado com a Brigada Militar qual seria o destino dos brinquedos doados, seu João Engelmann, disse ao Diário que o objetivo dele e da família foi, justamente, o de ressignificar a importância e o uso dos bens.
O estanciense, casado há 54 anos com Loiva Engelmann, 76 anos, contou que o casal ainda guarda presentes da festa de casamento, além de inúmeras coleções e lembranças de cada fase da vida dos filhos, de eventos sociais e encontros com amigos.
“Tenho minhas coleções de miniaturas de garrafas, calendários internacionais, selos, cartas – do tempo em que eu participava de clubes de correspondência.. coisas que os jovens de hoje nem sabem que existiram”, relatou Engelmann, sorrindo.
“Os brinquedos do meu irmão, Gustavo Engelmann, trancados no quarto não teriam o mesmo sentido que agora terão em uma instituição, por exemplo” – Carolina Engelmann
Apesar de demonstrar um certo apego às coisas, seu João destacou que ele e a esposa têm prazer em ajudar aos necessitados. E, com a idade somando algumas dezenas, o casal tem procurado “distribuir” artigos para amigos e pessoas especiais, como forma de eternizar as histórias da família.
Para a filha dos estancienses, Carolina Engelmann, 41 anos, a atitude dos pais representa muito. Mesmo admirando o cuidado que o casal tem com as coisas que guardam, Carolina destaca que tem os incentivado a refletir sobre o sentido das coisas, por outra ótica.
“Toda casa tem, ao menos, um cômodo para guardar coisas. Mas nossa casa tem vários deles. Minha mãe tem conjuntos de xícaras, louças maravilhosas, mas fora de uso. Tenho incentivado ela e meu pai a olharem as coisas de maneira diferente, valorizando, mas de maneira mais útil”, disse Carolina.
A estanciense destacou que também tem seus “guardados”, mas as memórias parecem ainda mais belas, quando compartilhadas.
“Os brinquedos do meu irmão, Gustavo Engelmann, trancados no quarto não teriam o mesmo sentido que agora terão em uma instituição, por exemplo. Doar, nem sempre é desfazer-se, mas ressignificar”, ponderou a estanciense, que relatou ter repassado uma coleção de Gibis a um afilhado, recentemente.
“Houve uma época em que meu pai viajava bastante e sempre trazia gibis para mim e para meu irmão. Acabei guardando uma coleção deles. Outro dia estava os observando e decidi doá-los a um afilhado. Certamente, ele terá as próprias memórias, sem imaginar quais foram as minhas. A vida tem dessas coisas”, sorriu Carolina.