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A história da placa em Lindolfo Collor que relembra os dez anos de uma grande enchente

29/04/2021 - 09h31min

Atualizada em 29/04/2021 - 09h36min

Placa está instalada em frente a casa onde morava Seno Klein (Créditos: Felipe Faleiro)

por Felipe Faleiro

Lindolfo Collor – No sábado, 23 de abril de 2011, uma enchente de proporções nunca antes vistas foi registrada na Encosta da Serra. Choveu tanto que impressionou Seno Klein, morador da Estrada Geral 48 Baixa. A casa dele e a propriedade da família não foram exatamente atingidas pela água ou por deslizamentos, mas o fato motivou Seno a manter o registro para a posteridade.

Seno encomendou, da Prefeitura de Lindolfo Collor, uma pedra de basalto, de cerca de um metro de altura e 30 centímetros de espessura. Mandou também fazer uma placa de metal, para relembrar o histórico acontecimento, e instalou ambos na frente de sua antiga casa em técnica enxaimel, defronte ao Centro de Agroecologia Jacob Klein, pai de Seno.

O aposentado faleceu em outubro de 2020, aos 91 anos, no Hospital São José, em Ivoti. Sociável, ele teria ficado triste por, entre outras coisas, não poder ver os parentes diante da pandemia e não mais poder passear, segundo sua filha do meio, a professora aposentada Neuli Klein Erig, 60 anos. Ela ainda hoje vive na propriedade, assim como seu genro Jônatas e a filha, Béverle.

“Meu pai nunca tinha visto nada assim. E queria deixar uma marca disto para que sempre fosse lembrado”, comenta Neuli. E assim, a placa em frente ao terreno dos Klein chama a atenção de quem por ali transita. “No sábado passado, um ciclista passou por aqui e parou para tirar foto da placa. Se meu pai estivesse vivo, ele certamente adoraria isto, e iria lá conversar”, disse ela.

Seno Klein não se importava com o custo da placa. Dizia que pagaria o quanto fosse necessário para criá-la, e assim foi feito, mesmo após ter sido alertado pela família de que, eventualmente, o valor fosse caro. É que, segundo Neuli, a inscrição era paga letra por letra. O próprio aposentado também foi quem pintou a placa com a cor branca.

Seno, que cuidava de uma horta ao lado de sua antiga casa, permaneceu nela até seus últimos dias de vida. A residência em questão tem mais de 100 anos. Ela possui uma parte mais antiga, originalmente enxaimel, e anos depois recebeu uma emenda. Parte dos materiais veio de outra casa, construída pelo tataravô de Neuli mais próxima do Arroio Feitoria, e que depois foi demolida.

“Meu pai nunca tinha visto nada assim. E queria deixar uma marca disto para que sempre fosse lembrado”

Fachada do Centro de Agroecologia, que leva o nome do pai de Seno, Jacob Klein (Créditos: Arquivo/PMLC)

A relação com o Centro de Agroecologia

Já a placa não foi imediatamente instalada depois da enchente, mas sim depois de alguns anos do fato. A época, exatamente, Neuli não soube precisar. Mas ela comenta que foi depois do falecimento da esposa de Seno, Elly Klein, ocorrido em 2013, de maneira que Elly possivelmente não ficou sabendo de sua instalação.

Outro fator que pode ter influenciado na confecção da placa foi a própria criação do Centro de Agroecologia. “Meu pai pode ter visto o nome do meu avô aqui em frente e pensou em criar algo pelo qual pudesse ser lembrado também”, argumenta Neuli. A Prefeitura queria criar uma escola no interior e contatou a família Klein, já que havia muitas crianças na localidade na época.

Na década de 1960, Jacob Klein vendeu parte das terras da família em 48 Baixa para a construção de uma brizoleta, como ficaram conhecidos os pequenos colégios de madeira erguidos na época do ex-governador Leonel Brizola, a partir do ano de 1959. Depois da criação do município de Lindolfo Collor, o Centro de Agroecologia foi erguido.

Seno Klein faleceu no ano passado, com 91 anos (Créditos: Arquivo/PMLC)

Enchente parecida só na década de 1960

A enchente em si causou muitos transtornos em 48 Baixa, onde o trânsito ficou caótico. Contudo, não foram tão intensos quanto em outros locais de Lindolfo Collor, como no Centrinho, onde a água subiu cerca de 1,5 metro em alguns pontos, ou em Sertão Capivara, na divisa com Portão, local em que casas foram totalmente engolidas pela terra deslizada.

“Eu me lembro de algo assim ali pelos anos 1960, quando ainda meu pai conseguiu ir até as casas e ajudar algumas pessoas que moravam aqui. Só que, em 2011, não teve como auxiliar. Todo mundo precisou sair de casa”, recorda Neuli, que sempre morou na localidade. Na ocasião deste primeiro temporal dito por ela, o município de Lindolfo Collor ainda nem existia.

Na ocasião de 10 anos atrás, carros e caminhões não conseguiam trafegar na estrada, que liga a localidade de 48 Baixa à Av. Presidente Lucena, em Nova Vila, interior de Ivoti. Somente depois de dois ou três dias, relembra Neuli, foi possível aos veículos maiores começarem a transitar pela área, e só cinco ou seis dias depois, os carros menores tiveram condições de passar por ali de novo.

Casamento e bodas em meio à chuvarada

A chuva que culminou nos transtornos durou vários dias. No dia 21 de abril de 2011, Seno e Elly celebraram 60 anos de casados. Oito dias antes, foi o casamento de Jônatas e Béverle. No dia depois o matrimônio, o temporal iniciou. “O solo já estava encharcado, então acho que contribuiu bastante. Quem vinha de Ivoti sofria mais”, diz Neuli.

A Estrada Geral 48 Baixa é bastante movimentada. A placa está no início do pátio, junto ao chão batido, por onde trafegam, por exemplo, ônibus da empresa Socaltur e de funcionários de empresas de Lindolfo. Mas há veículos que passam por ali em alta velocidade, levantando poeira e perturbando os moradores. A esperança deles é pela execução do asfalto, o que ainda não aconteceu.

A família, no começo, desacreditou das intenções de Seno, mas depois compreendeu. “Para ele, foi uma alegria muito grande fazer isto”, diz a filha. A placa, onde há o nome de Seno, tem, hoje, folhagens em frente. O aposentado sempre quis que houvesse plantas com flores junto dela. Além de lembrar da enchente, a construção foi também uma forma singela de manter o legado familiar.

Como o Diário cobriu o temporal

A edição de segunda-feira, 25 de abril de 2011, trouxe uma cobertura completa do temporal do sábado anterior. Na ocasião, houve estragos em praticamente todos os municípios, como Nova Petrópolis, Ivoti, Picada Café, Morro Reuter e Estância Velha, além de Lindolfo Collor.

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