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Aluno autista passa em quatro vestibulares para medicina
Diagnosticado com autismo enquanto estudava para o vestibular, Gabriel Passos, 40 anos, hoje cursa o quinto semestre de medicina, na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Sua trajetória é marcada por mudanças de rumo, dificuldades financeiras, luta familiar e resiliência diante de obstáculos que poderiam ter feito muitos desistirem.
Gabriel relata que durante a infância, a família não percebeu sinais de autismo, já que na época em que nasceu, diagnósticos do transtorno eram raros e, geralmente, limitados a casos mais graves. A descoberta ocorreu em 2023, enquanto se preparava para o vestibular de medicina, após duas crises sensoriais que, inicialmente, ele acreditava serem de ansiedade. Procurou, então, uma psicóloga amiga, que durante a consulta percebeu alguns sinais compatíveis com autismo, reconhecendo a necessidade de uma avaliação especializada.
Foi em uma neuropsicóloga especialista em autismo adulto, pouco antes de ingressar na universidade, que Gabriel passou por uma avaliação neurocognitiva completa, e confirmou a hipótese inicial. Para consolidar o diagnóstico, ele procurou ainda um psiquiatra especializado em autismo em adultos que, por coincidência, também é autista, e recebeu o diagnóstico que para ele foi libertador. “Percebi que não era maluco, apenas neurodivergente”.

Durante os estudos para Medicina, Gabriel Passos 40 anos foi diagnosticado com autismo nível 1 de suporte – (crédito: Arquivo Pessoal)
Diagnosticado aos 38 anos, Gabriel não considera o autismo um peso, e explica que ainda existe pouca informação sobre autismo em adultos. Viu uma oportunidade de usar sua própria experiência para levar conhecimento, e mostrar, por meio de suas redes sociais, que pessoas autistas, especialmente no caso de quem está no nível 1 de suporte como ele, podem, sim, realizar seus sonhos, e que as possibilidades são ainda mais amplas quando há acompanhamento adequado.
Como decidiu cursar medicina
Foi em sessões de terapia que a ideia de fazer medicina ganhou força, “Minha psicóloga me convenceu de que eu tinha capacidade.” Tirando a ideia de que era um sonho impossível para alguém como ele, vindo de uma família humilde. Pela primeira vez, Gabriel passou a se dedicar, de verdade, aos estudos para o vestibular, começando devagar, com apostilas doadas, depois migrou para plataformas on-line de cursinho, além de ajudar a mãe e lidar com as crises do pai ao mesmo tempo.
Foi em 2023, depois de anos de luta e dedicação. Gabriel foi aprovado em quatro faculdades de Medicina: UFMG, Unirio, Emescam e PUC-PR. As duas últimas conquistas vieram por meio do ProUni. Hoje, cursa o quinto período na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e acaba de iniciar o ciclo clínico.
Experiências anteriores
Antes de fazer medicina, Gabriel passou mais de 10 anos na área agrícola. Formou-se técnico em meio ambiente e agropecuária pela Ifes, cursou até o sexto período de agronomia e chegou a viver quatro anos na Alemanha, onde fez pesquisas e até deu cursos na área.
Em 2018, decidiu voltar ao Brasil com uma depressão profunda em busca de recomeço. Durante a pandemia, a situação da família ficou ainda mais difícil. A irmã de Gabriel havia perdido o emprego pouco antes, e a renda da casa passou a depender apenas da aposentadoria da mãe, que preparava feijoada para vender em sistema de delivery. Gabriel ajudava no preparo e nas entregas, mas durante a pandemia, o pequeno negócio não resistiu e acabou fechando as portas.
Nesse período, também enfrentava a dura realidade do alcoolismo do pai, uma luta presente desde a infância. “Desde que me entendo por gente, meu pai já bebia”, lembra. A situação se agravou após o assassinato de um tio, o que levou o pai a mergulhar ainda mais no vício.
Com informações do Correio Braziliense.
