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Após 44 anos, família colorense encontra irmã doada pelo avô ao nascer

26/11/2020 - 18h26min

Lindolfo Collor – Tatiana Sulsbach, 44 anos, cresceu sabendo que era adotada. Seus pais adotivos, Lauro e Cecília, nunca lhe esconderam esta informação e, inclusive, sempre lhe deram abertura para, caso desejasse, buscasse conhecer melhor o seu passado. No entanto, foi só depois da morte dos dois que ela se sentiu encorajada a procurar por sua família de sangue.

Nascida em Três Passos, registrada em Humaitá e atualmente moradora de Cidreira, a professora, casada e mãe de dois filhos, apesar da curiosidade, não havia ido atrás de seus pais biológicos antes por uma questão de gratidão a família que lhe criou. Mas, passados 18 anos do falecimento de sua mãe e cinco anos do de seu pai, a vontade de encontrar a mulher que havia lhe colocado no mundo começou a crescer.

“A partir do momento em que meu pai faleceu, o vazio da saudade se agigantou em mim. Isto se juntou a grande curiosidade que todo adotado leva dentro de si: saber o porquê. Então resolvi ir atrás”.

Mesmo com a sensação de “procurar uma agulha no palheiro”, como descreve Tatiana, ela iniciou uma peregrinação nas redes sociais. E foi assim, em um grupo virtual, que o destino acabou lhe surpreendendo.

Desencontro

A quase 200 km de distância, em Lindolfo Collor, a família biológica de Tatiana a procurava há 44 anos. Maria da Rosa Bonês tinha 20 anos e era solteira quando engravidou de Tatiana. Morando com seus pais no interior de Três Passos, em 1976, sua vida não foi fácil depois que contou ao seu pai a novidade.

A mais velha entre as irmãs mulheres, seu pai afirmou que a gravidez seria “um mau exemplo” para o restante da família. Expulsa de casa, ela foi morar em um asilo no centro de Três Passos, onde realizava serviços em troca da estadia. No entanto, quando entrou em trabalho de parto e foi levada ao hospital, seu pai foi informado e articulou junto com as enfermeiras a doação da criança recém-nascida – sem que a mãe soubesse de nada, comunicando-a apenas que havia tido um menino.

Está é a história que contou a vida inteira para os filhos que vieram depois: Elisabete, Elisandro, Alessandro e Lisete. Até sua morte, há dois anos, Maria se dedicou a procurar o “filho” que nunca teve a possibilidade de pegar no colo ou mesmo ver.

“Encontrar seu filho era o maior desejo dela. Nós víamos que ela não era uma pessoa feliz, porque, como ela mesma falava, sentia uma dor na alma por não ter um de seus filhos com ela”, diz Elisabete – primeira filha que Maria teve no casamento.

Assim, ainda quando Maria estava viva, Elisabete e seus irmãos, atendendo os constantes pedidos da mãe, entraram em grupos nas redes sociais para tentar fazer com que esse encontro virasse realidade. Mesmo anos tendo se passado sem pistas, após o falecimento de Maria, os irmãos seguiram as buscas.

Laços de sangue

Durante seus 44 de anos de vida, a história que Tatiana sabia sobre seu nascimento era a de que havia sido abandonada no hospital com 10 dias de vida e que seus pais adotivos conseguiram sua guarda quando já tinha 27 dias. E foi essa também a história que chegou até a família Bonês no início de setembro deste ano.

“Eu sabia que minha mãe não tinha abandonado ninguém. Mas, mesmo havendo falta de conexão na história, existiam motivos que nos levavam a acreditar que poderia ser ela”, pontua Elisabete, explicando que já havia uma desconfiança por parte da família de que o avô teria mentido sobre o sexo da criança para dificultar a busca. “Então, resolvi chamá-la. Desde a primeira vez que nos falamos, ainda por mensagem, senti que a busca havia acabado”, expõe.

O primeiro contato entre Elisabete e Tatiana aconteceu no dia 9 de setembro deste ano. Já o primeiro abraço, aconteceu quatro dias depois, no dia 13, quando após horas de conversas por telefone, Elisabete saiu de sua casa em Lindolfo Collor e foi até Cidreira conhecer pessoalmente aquela que, apesar de nenhuma comprovação, já considerava ser sua irmã.

“Estava sendo tudo muito verdadeiro e espontâneo, sentia nela uma ligação forte com a mãe. Ela é igual a nossa mãe. O jeito com que ela olha para nós, todo cuidado e amor que ela demonstra… Exatamente como a mãe costumava fazer”.

No dia 15 de setembro, data em que fazia exatamente dois anos da morte de Maria, sem saber do peso sentimental da data, Tatiana ligou de surpresa para Elisabete avisando que estava indo para Lindolfo conhecer seus outros irmãos. A partir de então, apesar da certeza que tinham internamente, eles foram atrás dos procedimentos necessários para a realização do teste de DNA. O resultado saiu cerca de um mês depois, no dia 19 de outubro, confirmando o parentesco.

“Este é o recomeço de nossas vidas”

Mesmo nunca tendo tido a oportunidade de conhecer a mulher que lhe deu a luz, Tatiana afirma que, por meio do carinho que recebe de seus irmãos e sobrinhos, tem conseguido saber quem foi Maria.

“Quando o resultado do DNA saiu, eles fizeram uma festa linda. Para mim, foi como um batizado, como se fosse meu aniversário de um aninho e a mãe estivesse comigo no colo. Através dos braços deles, me senti no colo de minha mãe”, confessa Tatiana.

Desde o momento em que os irmãos se encontraram, a rotina deles mudou: agora, todo final de semana, religiosamente, eles se reúnem. Trabalhando em horários e cidades diferentes, é preciso que cada um faça alguns “sacrifícios” para que a reunião aconteça. Assim, apesar das diferenças – tanto na criação quanto no jeito de ser –, eles procuram na convivência um meio para melhor se conhecerem e aprenderem a lidar um com outro.

“O tempo a gente não recupera, então, o que estamos fazendo é tentar viver juntos – e bem – daqui para frente”.

Tatiana presenteou os irmãos com uma camiseta que descrevia o sentimento de renovação que lhe transbordava, dizendo “este é o recomeço de nossas vidas”. No entanto, para ela, a busca ainda não acabou: Tatiana deseja também encontrar sua família paterna. Mas isto é algo para se pensar mais para frente, no momento, ela quer curtir os novos laços.

“Hoje não me sinto mais sozinha. Sei que, além de ter meus irmãos, a mãe está olhando por nós. Estou muito grata, muito feliz”, diz Tatiana.

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