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Do interior de Santa Rosa para o comando da BM de Santa Maria do Herval

12/05/2022 - 19h28min

Atualizada em 13/05/2022 - 12h16min

Por Cleiton Zimer

Santa Maria do Herval – A menina do interior de Santa Rosa, que se encantava ao ver os policiais na rodoviária da cidade, nunca deixou de acreditar que um dia seria possível e, hoje, Rosângela Nunes da Silva, 39 anos, é a comandante da Brigada Militar de Santa Maria do Herval – onde atua há 16 anos. Chegar até aqui foi um desafio que, por vezes, mostrava-se impossível, com forças contrárias – agora, executa seu trabalho com a maestria de quem escolheu estar exatamente onde queria.

Formatura de Rosângela em 2006 (Créd. Cleiton Zimer)

Eu sempre falava que, se um dia conseguisse, seria policial”, conta, recordando-se do tempo de criança quando ia para o centro da sua terra natal e via os policiais e o exército trabalhado. Seu pai era agricultor, sua mãe era diarista e depois foi trabalhar em uma escola. Com o fechamento da cooperativa onde o pai trabalhava, a família, com três filhos, vislumbrou oportunidades e vieram morar em Santa Maria do Herval, no bairro Amizade.

Rosângela tinha 13 anos na época. Já aos 14 começou em uma fábrica de calçados no Walachai, Morro Reuter. Lá, todos os colegas sabiam do seu sonho. “Uma vez, de meio dia, avistamos um policial e decidimos perguntar o que era necessário para entrar na BM. Eu tinha 15 anos. Ele respondeu que tinha que ter 18, carteira de motorista e segundo grau completo. Eu não tinha nada disso. Sei que fiquei toda decepcionada, cheguei a pensar que não era para mim pois faltava muito tempo”.

Os meses foram passando. Ficou sete anos na fábrica. Fez concurso no Estado e começou a trabalhar na escola Cônego Afonso Scherer. Fazia letras na época, cursando uma disciplina por semestre. “Não tinha condições de fazer mais”.

Quando estava por desistir, tudo deu certo

Assim como na fábrica, na escola todos sabiam do seu interesse pela Brigada Militar. Certa feita, uma colega avistou uma reportagem que dizia que a BM havia aberto concurso. “Jogou o jornal em cima da mesa e disse que estava ali a minha oportunidade”.

Rosângela tinha 23 anos e, naquela altura, era tudo ou nada, já que o ingresso na corporação só é possível até os 25. As duas foram até o comandante de Herval naquele mesmo dia. “Ela disse: aqui está a guria que quer entrar na BM”.

Não havia tecnologia como hoje, e, de bom grado, o comandante marcou um horário e fizeram a inscrição dela. “Quase tinha perdido a esperança”.

Fez o concurso em 2005. Eram 4 mil vagas e ela ficou em 3.100, aproximadamente. “Toda minha família era meio contra. Minha mãe tinha medo. Na época eu já namorava o André (seu marido), ele nunca botou muita fé”.

Desta forma, quando saiu a classificação, Rosângela ficou decepcionada consigo mesma, enquanto que a família, de certa forma, aliviada. Era a sua última oportunidade.

Mesmo assim, não deixou de acreditar. “Um dia eu estava na escola e saiu um novo edital. O Elísio Blume sempre acompanhava para mim e ele disse ‘Rosângela vem aqui, acho que te chamaram’. Eu lembro que fiquei tão fora que nem conseguia olhar”.

E naquele momento seu sonho acabara de se tornar realidade. Com a classificação geral ela estava na segunda chamada, mas as vagas eram por regiões e ela tinha escolhido a das Hortênsias. Abriram um curso em Gramado com 30 vagas e, de 3.100, ela foi para 23.

 

A primeira e única mulher na

Brigada Militar do Teewald

Rosângela está à frente do comando desde 2018, mas antes disso também já assumia na ausência de outros comandantes (Créd. Cleiton Zimer)

O curso confirmou sua decisão de vida

A partir de então foram longas idas e vindas – sem tecnologia, pegava o ônibus e resolvia as questões burocráticas. Após passar por todas as etapas iniciou o curso em Gramado em 2006. Durou seis meses, sendo quatro de aula e dois e estágio. O tempo de aula confirmou, de uma vez por todas, a expectativa que cultivou durante tantos anos. “Eu estava realizada. Como eu queria muito, achei o máximo”.

De lá tirou importantes lições que leva até hoje no meio profissional. “Sempre digo que todo mundo deveria passar por isso para aprender sobre respeito, disciplina e hierarquia”. Tudo era feito em grupo e, neste período de preparação, Rosângela era quem amenizava determinadas situações, aprendendo sobre o espírito de liderança. “Sempre digo que comandar não é mandar”.

Dos 30 da turma, ficou em 13º. “Nunca fui a mais inteligente, mas, sempre, dedicada”. Com a classificação a Soldado Rosângela se apresentou em dezembro de 2006, antes da virada do ano. Foi a primeira mulher a entrar para a BM em Herval e, até hoje, a única do Município. Outras se formaram mas estão atuando em cidades diferentes. “Eu escolhi vir para cá”.

Registro de 12 de maio de 2008, em uma Kartoffelfest. Há anos ela via os policiais no evento e, agora, é ela quem está lá com os colegas (Créd. Cleiton Zimer)

A Rosângela policial

O receio, ao vir trabalhar em Santa Maria do Herval, era justamente o de atuar em uma cidade onde era conhecida. Mas isso nunca interferiu. Sempre deixou bem clara a diferença entre o pessoal e profissional. “Me respeitam pela pessoa que eu sou, pela minha farda, minha profissão”.

Rosângela nunca deixou o fato de ser mulher interferir no seu trabalho para com os colegas. Sempre atuando de igual para igual.

Desde o seu ingresso, quando um comandante se ausentava, era ela que assumia as questões burocráticas inerentes ao posto. Desde 2018, é a comandante da BM de Herval como soldado mais antigo.

O desafio do GPM

Em 2017, por um período, Rosângela ficou sozinha na Brigada Militar. Um a um viu os colegas indo embora. Ficou só ela, eventualmente com apoio de Gramado. A situação chegou ao agravo do comando-geral alertar para o fechamento do GPM.

Estando no Município desde 2006, ajudando em várias conquistas como a aquisição de viaturas e armamentos, Rosângela se viu diante de um momento delicado. “Estamos em uma cidade que está crescendo. No momento que a BM fosse sair, seria difícil voltar”. Pensando na população, contatou as autoridades e, em uma força conjunta, reverteram a situação – completaram o efetivo e a Brigada Militar não fechou.

E assim, com apoio mútuo, a comandante destaca que a população em geral apoia o trabalho da Brigada Militar. “Às vezes não conseguimos atender no momento, mas nunca deixamos de ir verificar. As pessoas até nos cobram isso, com razão, mas precisam entender que trabalhamos dentro das condições”.

A comandante destaca que focam no policiamento comunitário, aproximando as pessoas. “Passamos nos estabelecimentos comerciais, por exemplo, e conversamos. Porque, quando acontece alguma coisa, são essas pessoas que vão nos informar”.

Tomei a decisão certa na vida

A comandante largou Letras e se formou em Educação Física em 2018, pela Unisinos. “Tomei a decisão certa na vida. Faço o que eu gosto e ainda consigo conciliar com a Educação Física”.

Além disso, ela faz parte da equipe que aplica os testes físicos da Brigada Militar.

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