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A história da égua que chorou a perda de sua dona em Estância Velha

10/02/2023 - 15h05min

Atualizada em 10/02/2023 - 15h10min

POR CÂNDIDO NASCIMENTO

Estância Velha – Alessandra de Freitas Ferraz tinha apenas 19 anos quando faleceu em um acidente de carro. Ligada ao CTG Estância do Campo Grande, ela foi a 2ª e 3ª Prenda Juvenil e 1ª Prenda Adulta. A quarta Filha de Alexandre Vital Pinto Ferraz e Leoni Freitas Ferraz, ela era a mais nova da família. Alexandre também perdeu outra filha, Patricia, por problemas de saúde, cerca de um ano antes.

A história de amizade de Alessandra com a égua Garufa surgiu quando ela ganhou o animal do pai, que a trouxe de uma fazenda de Rio Pardo, onde trabalhava seu irmão Irineu Amâncio. O familiar adoeceu e Alexandre permitiu que ele vendesse algumas cabeças de gado, então recebeu a Garufa de presente e a deu para a filha. Na época, a égua tinha 10 anos e Alessandra 15.

AMOR SEM IGUAL

A relação das duas era de amor incondicional e fora do comum, relembra o pai. Juntas, tiveram muitas participações em CTGs da região, pois laçar era uma das paixões da jovem prenda, que era a grande parceira nos rodeios e torneios. Ela chamava, “minha potranca” no local onde era cuidada por Paulinho Teixeira (ou Paulinho Cabeludo), que tinha uma hotelaria de cavalos.

Após ouvir a dona, o animal vinha correndo e era abraçado carinhosamente por ela. Quem hoje tem os cuidados com a herança deixada pela filha é o próprio pai, que trata, dá o pasto e, nos dias frios, guarda Garufa na estrebaria para protegê-la, com todo o cuidado e atenção que ela merece.

MORTE PRECOCE

A trágica manhã do dia 12 de abril deu fim, de forma precoce, às conquistas, aos sonhos e, de modo geral, da caminhada de Alessandra. Com apenas 19 anos, ela colidiu seu carro na Av. Brasil, ao voltar para casa, depois de deixar amigos e o namorado em casa, em Portão. Ela foi jogada para fora do veículo e o poste no qual bateu acabou caindo por cima de seu corpo.

A morte abalou toda a família, bem como os tradicionalistas de todo o município, já que a jovem era integrante do CTG Campo Grande e participava de competições. De acordo com relatos da época, a principal hipótese é de que ela tenha dormido ao volante, já que estava retornando para casa às 7 horas, após participar de uma confraternização.

Além disso, foi citado o fato dela estar passando por uma semana cansativa, já que havia participado da Fimec, acordando muito cedo e dormindo tarde. Alessandra trabalhava em um curtume de Portão, a mesma empresa na qual o pai, Alexandre Ferraz trabalhava.

Alexandrão” recorda a relação de amizade da filha com Garufa

Ela (Garufa) é uma relíquia da nossa família, uma lembrança da minha filha, que eu cuido com todo o carinho”, conta Alexandre Feraz, ou Alexandrão, como é conhecido. Ele relata a chegada da égua crioula com cruza de quarto de milha na sua casa, e a relação de amizade que a filha manteve com ela até a sua partida.

Alexandrão foi fundador do CTG Estância do Campo Grande, onde estão fotos, as faixas de prenda de Alessandra, o chapéu que ela usava. A vice-patroa da entidade tradicionalista, Tatiana Loiva Monteiro foi quem abriu as portas do CTG na manhã de quinta-feira, dia 9, para mostrar as lembranças que ficaram para homenagear a prenda.

<OLHO> “A Alessandra faz parte desta história do CTG, por isso tem um quadro e fotos em homenagem a ela, que foi 2ª e 3ª Prenda Juvenil e 1ª Prenda Adulta do CTG”, explica Tatiana.

O Atual patrão do CTG é Ademir Kessler. Alexandre foi um dos fundadores da entidade , em 1996, junto com os ex-patrões Mário Krug, Juvêncio Machado, Paulo Haupental, Irineu Leonardo Petry, Altair Bemon, Nilson Consoli, Eloi Almeida, Davenir da Silveira, Vilmar Steinz.

TRAJETÓRIA

O pai de Alexandre, Amâncio Ferraz, que morava em Quitéria, distrito de São Jerônimo, foi patrão do CTG Zeca Neto e teve 10 filhos, sendo sete homens e três mulheres, todos ligados ao tradicionalismo. Essa chama gauchesca estava sempre acesa no sangue de Alessandra, garante o seu progenitor.

Ele conta que tinha 25 anos quando veio morar em Estância Velha, vindo para trabalhar no Posto Texaco (Ipiranga atualmente), onde foi funcionário de Nivaldo Winter. Depois trabalhou plantando acácia para a empresa Seta, passou pela fábrica de gelatinas Gelita, Curtume Bender Schuck (caldeirista) e, por fim, no Curtume Pampa, em Portão. Inclusive a filha, Alessandra foi trabalhar na empresa, após cursar Curtimento na Escola Técnica do Senai. “Foi o gerente-geral Professor Pardal quem conseguiu essa vaga para ela”, conta o orgulhoso pai. Atualmente, ele reside em uma chácara, que pertence ao dono do curtume. Ali tem algumas cabeças de gado e cuidada Garufa e da égua Lua.

ÉGUA CHOROU NO VELÓRIO

Uma forte marca na lembrança de “Alexandrão” refere-se à reação da égua no velório de Alessandra.

“Quando viu ela (Alessandra) no caixão, Garufa ficou muito furiosa. Parecia que queria ir lá. Cavocava o chão com as patas e bufava”.

No pescoço, durante a cerimônia, o animal tinha uma faixa preta. Depois da morte de Alessandra, que era “os dengos da mãe”, a sua esposa Leoni ficou muito depressiva e faleceu em 2011. Ele chegou a sair do trabalho depois da morte da esposa. Alguns anos depois, uniu-se com a atual companheira, que também era viúva, Marcia Raquel Weimer.

Poesia do pai

Que muito eu quero zelar a tua memória
Vinha de pingo alçado no freio,
Era bonito de ver
Chegava com humildade,
Era o seu jeito de ser
Andava bem a cavalo
Onde se apresentava era a festa campeira
O que ela mais gostava
Era o meu orgulho na pista
Ver a minha filha Alessandra laçar
Chegava e pedia porta
E deixava o bovino andar
Levantava o seu laço, era bonito de olhar
Abria a sua gatiada pra rua e o laço ia pelo espaço
Só sentia o tinido da argola de aço
E o laço estava nas guampas
Manda o gancheiro tirar
O boi estava no laço
Era o seu jeito de ser
Levantava a mão direita
Para Deus agradecer

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