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ANIVERSÁRIO DE PICADA CAFÉ: Parte da história da música gaúcha resguardada no interior da Picada Café

17/03/2022 - 17h27min

Wendelino toca um de seus acordeões que beiram os cem anos – alguns até passam desta idade (Créditos: Gian Cristiano Wagner)

Músico há mais de 60 anos, Seu Wendelino também é um colecionador apaixonado

Uma pessoa que nasceu para tocar acordeon e para levar a cultura gaúcha para todo o Brasil. Essa é uma das formas de apresentar Wendelino Silirio Kinzel, 84 anos, hoje morador de Jahmmerthal, no interior do município. Seu Wendelino é um músico de mão cheia. Dominador dos instrumentos de fole, ele conta que sabe tocar qualquer tipo de acordeon. “Bandoneón, qualquer tipo de acordeon de botão, de quatro baixos, oito baixos, 16 baixos…, acondeon apianado (que são os modelos com teclas no lugar dos antigos botões), violão, escaleta, harmônica de boca, entre outros”, conta.

A música chegou cedo na vida do morador de Picada Café. Quando Wendelino nasceu, em 1937, a família vivia em Santa Rosa, em uma localidade que hoje é o município de Porto Lucena). O pai de Wendelino, João Leopoldo Kinzel, tinha uma bandinha alguns integrantes. Alguns moravam mais longe e deixavam os instrumentos no local do ensaio: a casa dos Kinzel. Quando o pequeno Wendelino tinha entre três e quatro anos, ele observava o pai e os músicos ensaiar e já acompanhava o ritmo. “Os instrumentos eram difíceis de reunir, aí ficavam lá em casa”, recorda. “Tinha o jazz-band, que era a bateria, um bumbo e mais dois ou três periféricos, que seriam o prato mais um ou dois tamborzinhos em cima, tinha o rabecão. Os instrumentos ficavam lá em casa”, conta.

As comunidades daquela época faziam poucas festas na comunidade, sendo entre três e quatro por ano. Durante a semana, João e um vizinho ensaiavam. “A bateria tava ali, eu lembro que eu ficava ‘dun da da’ (reproduzindo o ritmo de uma valsa). Com três, quatro anos, eu já tocava. Pena que não tem retrato daquela época. Hoje em dia nem é retrato mais, é foto né?”, brinca ele, sempre com um grande senso de humor.

O músico e a esposa Guilhermina tocam juntos, ela o acompanha na percussão (Créditos: Gian Cristiano Wagner)

 

HÁ QUASE 60 ANOS NA OMB – Com a carteirinha emitida em 1963, Wendelino é um dos primeiros 5 mil músicos registrados pela Ordem dos Músicos do Brasil, entidade criada apenas três anos antes para regulamentar a profissão. “Naquela época a OMB tomava os instrumentos de quem se apresentasse e não fosse músico. Apenas locais beneficentes podiam”, explica. Por causa disso, Wendelino precisou procurar a ordem para tirar a carteirinha que provava que ele era músico profissional. “Eu já estava envolvido com a música, mas precisava provar que era profissional. E para provar precisava fazer a prova dos agentes autorizados a fazer e diriam se você seria músico profissional ou não. Eu precisava [do registro] para tocar em CTGs, em viagens do Estado, e na divulgação da cultura”, conta ele que precisou viajar até Tapes para fazer o teste.

 

TRADIÇÕES GAÚCHAS

O acordeonista começou a tocar ainda em Santa Rosa, onde já era membro de um CTG. “CTG era onde eu podia tocar, e tocar a nossa música também a bandinha né, nos clubes não podia tocar”. Quando chegou em Porto Alegre, no início dos anos 60, logo foi ‘recrutado’ por tradicionalistas da capital. “Logo descobriram que eu sabia tocar acordeon e foram lá em casa me convidar e foi fundado o CTG Sentinela do Rio Grande (Porto Alegre) em 1961”, conta ele que ainda guarda a carteirinha número 4, de sócio fundador.

Wendelino foi membro ainda do CTG Tio Quinca, também de Porto Alegre, e no final daquela década foi para o 35 Centro de Tradições Gaúchas, onde fez parte da invernada como músico por 15 anos. “Não ganhava muito, mas dava um prazer imenso. Era simplesmente pela divulgação da cultura gaúcha, principalmente. Depois veio a ditadura e mandou parar praticamente por um tempo”, recorda.

Nos anos 80 a indústria cultural ganhou forma no Rio Grande do Sul e a cultura gaúcha começou a ser exportada para outros estados. “As secretarias da cultura começaram a se preocupar em divulgar o gaúcho, pilchado, homem do campo”, recorda. “Minha vida sempre foi voltada a cultura, a música, a história”.

 

UM ACERVO DE COLECIONADOR

A cultura de Wendelino não está somente nas memórias que carrega, mas muito também se encontra na gigantesca coleção de instrumentos musicais. São quase 300 peças, sendo a maioria delas acordeões, de teclas e de botões, com variedade de baixos, modelos, idades e tamanhos. O mais antigo é do final do século 19. Outro, que Wendelino ainda toca, é de 1918. Ele também coleciona violões e outros instrumentos, como as harmônicas de sopro, por exemplo.

Wendelino tocando uma ‘escaleta’ enquanto mostra a grande coleção de instrumentos (Créditos: Gian Cristiano Wagner)

 

 

 

 

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