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Primo acusa deputado Paulo Pimenta de operar esquema de fraude na Fronteira
O depoimento de um primo do deputado federal Paulo Pimenta (PT) joga luz sobre uma investigação que se arrasta há 10 anos, na qual o parlamentar é investigado por estelionato. Em entrevista à RBS TV, o médico veterinário Antônio Mário Pimenta, o Maíco, diz que o deputado era “operador” de um esquema que lesou arrozeiros de São Borja em pelo menos R$ 12 milhões.
Produtores rurais da cidade alegam ter sofrido o golpe após venderem sua produção para uma arrozeira. Entregaram os cereais, mas não receberam o pagamento.
— Eu sou de uma leva de uns seis ou mais que perdemos de 7 mil a 10 mil sacos de arroz. E teve dois ou três que levaram prejuízo de 90 mil sacos, outro de 150 mil sacos — afirma um dos agropecuaristas lesados, que preferiu não se identificar.
Ao cobrarem a dívida do administrador da arrozeira, o veterinário Maíco, 53 anos, os produtores ouviram que o verdadeiro dono da empresa seria o primo dele, o deputado federal Pimenta, líder do PT na Câmara dos Deputados.
Pimenta é investigado por estelionato no Supremo Tribunal Federal (STF) desde 2012. Parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR) afirma existir “indícios que apontam para o deputado federal como o verdadeiro proprietário da arrozeira, ou, ao menos, como quem mantenha com a citada empresa algum grau de vinculação que o faça também responsável pelas fraudes noticiadas”.
Localizado pela RBS TV na cidade de São Francisco de Assis, Maíco admitiu ligações do primo com a empresa. Disse ter assumido a arrozeira ao ser convencido pelo deputado de que seria um bom negócio – isso porque, segundo ele, a empresa recém teria realizado uma negociação de arroz avaliada em R$ 8 milhões, o que demonstraria um boa situação financeira.
— De fato, era um negócio fantástico, um negócio de 200 mil sacos de arroz, pegando uma empresa capitalizada. É praticamente um ano inteiro sem ter que comprar arroz.
O primo diz que o parlamentar seria o “operador” de um esquema do qual também fariam parte um advogado e suposto lobista de Brasília e o ex-diretor de Infraestrutura do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) Hideraldo Caron, afilhado político de Pimenta e que deixou o governo de Dilma Rousseff, em 2011, por suspeitas de corrupção.
Maíco diz que participou de uma reunião com ambos.
— Foi explicado (na reunião) como seria a operação da empresa, que o negócio era bom, estava andando. Até eu acreditei — disse o médico veterinário, que relata ainda que “prestava conta” a Caron.
No entanto, o negócio supostamente lucrativo virou frustração. O primo do deputado descobriu que a carga de R$ 8 milhões de arroz não existia. E mais: ao checar a autenticidade de laudos usados para atestar a quantidade e a qualidade do cereal, descobriu que os papéis eram falsos. Alertada por Maíco, a empresa certificadora, com sede em Pelotas, denunciou o caso à Polícia Federal em 2009.
— Vimos que os documentos não eram legítimos e que tinha sido furtado documento interno da empresa, com falsificação dos resultados que até não condizem com as especificações técnicas do produto em questão — afirma o dono da empresa, Edemundo Rodrigues Garcia.
O inquérito ainda não esclareceu o que estaria por trás da negociação do arroz, se o dinheiro de fato existiu e qual sua origem. Depois da entrevista à reportagem, o primo do deputado Paulo Pimenta prestou depoimento à PF – o relato deve ser encaminhado ao Supremo, para ser anexado ao inquérito no qual o parlamentar já teve o sigilo bancário quebrado.
Decisão do STF publicada no mês passado impôs uma dupla derrota ao deputado: além de negar o arquivamento da investigação, os ministros decidiram remeter o processo à Justiça Federal de Uruguaiana, contrariando pedido de sua defesa.
Remessas de dinheiro a posto de gasolina
Apesar das dificuldades em tocar o negócio, o veterinário Antônio Mário Pimenta diz que algumas vezes a arrozeira chegou a dar lucro. E que fez transferências bancárias e depósitos em dinheiro na conta de um posto de gasolina que pertence ao deputado, na zona norte de Porto Alegre.
Avaliado em R$ 485 mil, o posto aparece na relação de bens de Paulo Pimenta, declarada à Justiça Eleitoral. Em 2014, fez doação de R$ 15 mil para a campanha do petista.
— Ele (deputado) pediu para fazer umas remessas, não sei se ligada a ele, para um posto de gasolina em Porto Alegre. Umas três ou quatro remessas, talvez mais, faz muito tempo, no valor de R$ 30 mil, R$ 40 mil, na época — recorda.
Maíco conta que as remessas eram feitas de forma fracionada, sempre em pequenas quantias, por orientação do deputado. O veterinário diz ainda que não teve intenção de enganar os produtores. Ele admite, no entanto, que houve má gestão. E que as operações da empresa se transformaram numa espécie de “pirâmide”, na qual novas transações eram feitas para cobrir rombos anteriores.
— Quando tu está no negócio, tu não está pensando, tu não faz de sã consciência, tentando dar golpe. Caso contrário, nem estava aqui, tentando reverter o prejuízo.
Maíco diz que foi orientado pelo primo a deixar a cidade de São Borja após o calote, mas decidiu permanecer no município. Mudou-se apenas há poucos meses, para cuidar das terras da família em São Francisco de Assis.
— Só do meu próprio bolso já perdi pra mais de R$ 300 mil, R$ 400 mil, entre (ações) trabalhistas e coisas que foram pagas. Eu paguei (algumas dívidas) vendendo gado, eu sou produtor, minha origem é dentro de uma cooperativa, eu sou veterinário de formação, eu sei onde é que arde — diz.
Fonte: Gaúcha ZH