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Serviços voltados às mulheres são alvo de denúncia no RS
Desde que a Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM) foi extinta e transformada pelo governo gaúcho no Departamento de Políticas para as Mulheres, vinculado à Secretaria de Desenvolvimento Social, Trabalho, Justiça e Direitos Humanos, comandada pela primeira-dama Maria Helena Sartori, o orçamento destinado à área foi reduzido drasticamente. De cerca de R$ 10 milhões, em 2014, passou para apenas R$ 180 mil em 2018.
O corte de verba e a queda na qualidade dos serviços ofertados pelo Estado em defesa da mulher foram denunciados, na semana passada, ao Ministério Público (MP) do Rio Grande do Sul pelas deputadas estaduais Stela Farias (PT) e Manuela d’Ávila (PCdoB). No texto, elas afirmam que “as Patrulhas Maria da Penha estão com as viaturas descaracterizadas e redirecionadas para outros tipos de atendimento”, que as “Salas Lilás – que contavam com recursos federais para atendimento das mulheres nos Postos Médicos Legais do Instituto-Geral de Perícias – estão praticamente desativadas” e que a falta de recursos atingiu também o atendimento em outras áreas, como as Delegacias Especializadas no Atendimento à Mulher (Deams) e o Centro de Referência Vânia Araújo, no Centro da Capital. A denúncia foi encaminhada à Procuradoria de Direitos Humanos.
Para Stela, o desmonte dessas políticas trouxe consequências como o aumento dos índices de feminicídios e de estupros. “Mostramos como o Estado vem extinguindo políticas públicas para as mulheres de forma permanente, retirando recursos públicos anteriormente destinados às políticas públicas, sucateando e fechando órgãos”, argumenta a deputada.
Para a direção do Departamento de Políticas para as Mulheres, no entanto, a situação apresentada pelas parlamentares não representa a realidade. “Temos fatos, e uma questão levantada a título de política eleitoral, partidária, mas que cria um clima de insegurança no qual a principal prejudicada é a mulher”, critica a diretora Salma Valencio Farias. “O orçamento de R$ 10 milhões era uma estimativa, baseada em convênios federais, considerando o que havia sido captado de recursos, mas já pré-definido. Não era um orçamento para empregar em serviços”, explica. Hoje, segundo ela, o departamento absorveu esses convênios, executando-os, e segue na articulação entre todos os serviços, como a secretaria fazia antes.
Salma ressalta que está sendo estudada a ampliação das delegacias voltadas à violência contra a mulher – hoje, no Estado, existem 22. Além disso, a Patrulha Maria da Penha, que foi criada para acompanhar a rotina daquela mulher que entrou com medida protetiva contra algum agressor, está presente em 27 municípios com, pelo menos, uma viatura destinada a esse fim. Porto Alegre, por ser uma cidade maior, possuía mais viaturas. “Não tivemos nenhum óbito de mulher acompanhada desde a implementação do sistema”, comemora a diretora, destacando, também, a entrega de mais quatro viaturas, compradas com recursos do próprio departamento, à Patrulha e às delegacias específicas.
A questão das Salas Lilás é um pouco mais complexa. Salma conta que, quando assumiu o comando do departamento, constatou que as salas entregues eram apenas isso – espaços pintados na cor lilás. “A mulher aguardava ali por um exame de corpo delito e pela perícia, isolada do agressor, mas isso não é um serviço de acolhimento”, argumenta. Agora, os espaços estão passando por revitalização e ofertarão uma série de serviços, efetuados por equipe disciplinar composta por assistentes sociais, médicas e psicólogas.
Atualmente, existem 13 Salas Lilás – algumas estão funcionando, como as de Alegrete, Porto Alegre e Caxias do Sul. Nos próximos meses, o departamento deve inaugurar o espaço em Santa Rosa, Canoas e Lajeado. As Salas Lilás de Bagé, Santana do Livramento, Erechim e Pelotas passam por tratativas.
Para o serviço de acolhimento – que retira mulheres em situação de violência de perto do agressor, transferindo-as, bem como filhos que dependem dela, a outros locais -, há propostas que envolvem consórcios entre municípios. “Manter uma casa em cada município é caro – às vezes, há uma mulher em uma casa que pode abrigar 20. Assim, as casas municipais seriam tornadas regionais”, resume Salma. O departamento negocia, atualmente, uma casa na Região Metropolitana, que daria suporte às cidades de Cachoeirinha, Gravataí, Viamão, Alvorada e Canoas, e outra na cidade de Vacaria, abrangendo a região dos Campos de Cima da Serra. A ideia é que ambas sejam entregues até o final do semestre.
Linha telefônica do Centro de Referência Vânia Machado não funciona há quase um mês
O dia a dia de quem trabalha com os serviços de proteção à mulher no Estado, porém, não condiz com a realidade apresentada pela diretora do Departamento de Políticas para as Mulheres, Salma Valencio. No Centro Estadual de Referência da Mulher Vânia Araújo Machado, na travessa Tuyuti, no Centro de Porto Alegre, por exemplo, a equipe não está completa. Atualmente, o espaço conta com duas psicólogas, uma advogada, uma assistente social, um motorista, uma estagiária de Direito e uma vigilante. O ideal seria que fossem dois profissionais de cada área.
Além disso, desde que a coordenadora Márcia Santana faleceu, em março do ano passado, o centro não tem uma coordenação local. Por falta de pagamento, a linha telefônica não funciona há quase um mês – algo que acontece quase mensalmente e que impede um primeiro contato de uma mulher que possa estar precisando de ajuda.
Embora a equipe seja comprometida com o atendimento às mulheres, funcionários do local, que preferiram não se identificar, lamentam a falta de engajamento, por parte do Executivo, na causa. Outra dificuldade frequente é o abrigamento – funcionários relatam que, quando os abrigos de Porto Alegre estão cheios, cidades vizinhas, como Canoas, e até mais distantes, como Santa Rosa, se recusam a receber mulheres que precisem de um local para ficar.
“Os abrigos são municipais, mas o Estado tinha de intervir nisso”, comenta um dos funcionários. Sem telefone e praticamente sem divulgação, o Centro tem pouca demanda, e estava vazio quando o Jornal do Comércio esteve lá, na quinta-feira passada.
A Sala Lilás da Capital, localizada no 1º andar do Instituto Médico-Legal (IML), na avenida Ipiranga, conta com uma equipe completa, composta por dois psicólogos e três assistentes sociais. Segundo funcionários, não há falta de recursos humanos, e transtornos eventuais são causados por problemas do cotidiano, como a falta de telefone ou de equipamentos.