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Quase 190 mulheres são estupradas por dia no Brasil; quatro são mortas
O Brasil mantém, há cinco anos consecutivos, a média de quatro feminicídios por dia. A nova atualização do Mapa Nacional da Violência de Gênero, divulgada na terça-feira (19), mostra que apenas no primeiro semestre de 2025 foram registradas 718 vítimas de feminicídio. São Paulo lidera o ranking com 128 casos, seguido por Minas Gerais (60), Bahia (52), Rio de Janeiro (49) e Pernambuco (45).
O levantamento também aponta que os estupros contra mulheres continuam em patamar alarmante. Entre janeiro e junho deste ano, foram 33.999 registros, uma média de 187 por dia. Mesmo com leve queda em relação a 2024, estados como Rondônia, Amapá e Roraima apresentaram taxas que chegam a 16 casos para cada 100 mil habitantes.
Subnotificação e falhas na proteção
A violência de gênero no país é ainda mais grave quando se considera a subnotificação. Dados da Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher, do Instituto DataSenado, revelam que 61% das vítimas não chegam a registrar ocorrência. Entre as que denunciam, sete em cada dez não solicitam medidas protetivas.
Para especialistas, esse cenário expõe o abismo entre a legislação existente e a realidade vivida pelas mulheres. “O Brasil tem legislações avançadas, como a Lei Maria da Penha, considerada uma das melhores do mundo. Mas precisamos transformar o que está no papel em vivência. Isso só acontece com investimento em políticas públicas e articulação entre saúde, segurança e assistência social. É hora de sair do discurso e entrar no recurso”, destacou Beatriz Accioly, doutora em Antropologia pela USP e líder de Políticas Públicas pelo fim da violência contra as mulheres no Instituto Natura.
Impactos que atravessam gerações
Além da violência física e sexual, outras formas de agressão, como a psicológica, moral e patrimonial, seguem invisibilizadas. “Essas violências não deixam marcas no corpo, mas causam danos profundos e ainda são pouco reconhecidas pela sociedade e pelas instituições”, ressaltou Beatriz.
Para a jornalista Lola Ferreira, co-coordenadora do projeto do Mapa da Violência de Gênero pela Gênero e Número, os dados também revelam a gravidade da violência sexual contra meninas. “Quando olhamos para os números de estupro, vemos que a incidência é altíssima entre meninas. Isso mostra que falhamos como país em proteger mulheres e meninas e que precisamos transformar informação em ação concreta, com recursos reais e respostas articuladas.”
Sociedade e jornalismo na linha de frente
Especialistas reforçam que a luta contra a violência de gênero não pode se restringir ao poder público. “Sempre pedimos para que as mulheres quebrem o silêncio, mas não preparamos a sociedade para escutá-las. É preciso saber apoiar, cobrar das autoridades e não ser cúmplice dessa violência”, disse Beatriz.
Lola também ressaltou o papel da comunicação. Para ela, o jornalismo precisa ir além da divulgação de estatísticas: “É por meio da comunicação que conseguimos expor a dimensão social do problema e evitar que esses números sejam naturalizados ano após ano.”
Um mapa como ferramenta de mudança
O Mapa Nacional da Violência de Gênero é fruto de uma parceria entre o Observatório da Mulher contra a Violência do Senado Federal, o Instituto Natura e a Gênero e Número. O objetivo é reunir dados oficiais e indicadores regionais que possam orientar políticas públicas e servir como instrumento de pressão por prioridade na agenda política.
“O Mapa é resultado de uma parceria que une pesquisa, políticas públicas e comunicação. É um exemplo de como podemos construir debates e soluções quando diferentes setores caminham juntos”, concluiu Lola Ferreira.
Onde buscar ajuda
Casos de violência podem ser denunciados nas Delegacias de Defesa da Mulher (DEAM) ou em qualquer distrito policial. Também é possível acionar a Central de Atendimento à Mulher pelo telefone 180 ou via WhatsApp no número (61) 99656-500. Aplicativos como PenhaS, Tina e SOS Mulher oferecem suporte adicional às vítimas.