Região
Enxurrada histórica deixa rastro de tristeza em Santa Maria do Herval; mãe e filha morreram
Horas de chuva intensa se somaram ao acumulado da semana e geraram uma catástrofe
Mãe e filha morrem e vários locais ficam destruídos na mais grave enxurrada da história do Herval
Por Cleiton Zimer
Santa Maria do Herval – A semana passada foi de muita chuva, que na sexta-feira (17) se intensificou com o chegar da noite. O primeiro susto veio com uma forte queda de granizo por volta de 20h30 – passou rapidamente, mas, com a precipitação seguindo intensa e algumas pedras de gelo caindo volta e meia.
Ao chegar das 22h o alerta acendeu em vários pontos e, à meia-noite, diversos locais já estavam alagados.
Logo no início da madrugada de sábado (18) o Rio Cadeia começou a transbordar no Centro, refletindo a gravidade da situação – pois, quando a água chega neste nível, significa que a situação toda está crítica.
Durante a madrugada milhares de frangos morreram afogados no bairro Amizade. Pontes transbordaram, dezenas de estradas foram destruídas e casas foram invadidas pela água.
A manhã começou tensa com muita chuva. Até então, pelo menos, a preocupação era somente com as intercorrências materiais.
No entanto, ao meio-dia, um barranco veio abaixo na Linha Marcondes Baixa. Mãe e filha morreram soterradas num local de difícil acesso [divisa entre Gramado e Herval].
Mais de 200mm em poucas horas; 400mm em oito dias
Conforme levantamento feito pelo morador de Alto Morro dos Bugres, Volnei Gressler, ao longo do dia de sexta-feira choveu 15mm. Já das 18h de sexta até 15h de sábado – em que aconteceram os estragos – foram 200mm. ” Nesses últimos 8 dias passou de 400mm.”
Filha correu para salvar mãe, e ambas morreram soterradas
As águas deste final de semana deixarão para sempre lembranças tristes, tanto pelos estragos, mas muito mais por terem ceifado vidas.
A chuva já tinha parado. Tudo parecia estar bem. Até que por volta do meio dia um desmoronamento matou mãe e filha, Ledwina Lehnen, 86 anos, e Elisabeta Maria Benisch Ponath, 51, na Linha Marcondes, na divisa entre Gramado e Herval.
No local também estava a filha de Elisabeta, Débora Carolina Benisch Schmitt e seu padrasto, Olavo Ponath, que conseguiram se salvar.
A reportagem esteve na comunidade e conversou com os vizinhos Luceu e Anivo Link, que relataram que escutaram um forte estrondo e tudo veio abaixo em questão de segundos.
Ao ouvirem os estalos, mulher, companheiro e filha correram para salvar a idosa de 86 anos que estava no interior da residência.
Mas só o homem e a enteada se salvaram. Mãe e filha morreram.
Após horas de buscas os corpos foram resgatados pelo Corpo de Bombeiros de Gramado, Defesa Civil e moradores, com apoio da Brigada Militar de Herval. Foram removidos ao Instituto Médico Legal.
O local é de difícil acesso. A residência estava ilhada e, para fazer o resgate dos corpos foi necessário passar por cima de pontes com água transbordando.
A comunidade hervalense está consternada com o ocorrido. Embora a casa estivesse situada em Gramado, na divisa, as famílias pertenciam a Santa Maria do Herval, faziam todos os seus afazeres no Teewald.
Ledwina era conhecida como uma senhora muito humilde. Chamavam-na de Winie. Por muitos anos vinha a pé da Marcondes para Boa Vista do Herval, e também Centro, onde comprava o que precisava e carregava num saco para casa.
A despedida acontece às 18 deste domingo na Igreja Sen. Purificação Marcondes.
A alguns metros de onde mãe e filha morreram, desmoronamento quase atinge casa de idosa
A alguns metros do local onde mãe e filha morreram soterradas na Linha Marcondes, ocorreu outro desmoronamento, praticamente no mesmo horário.
Dona Inari Lubenof, 67 anos, estava sozinha em casa. Era por volta do meio-dia. Quando foi no galpão escutou um estrondo, saiu para olhar e viu o morro descendo.
Vinham árvores, terra, com muito barulho. Ficou com medo: “para onde correr?”
A força foi tamanha que as árvores passaram por cima do rio e pararam rente ao galpão, que fica ao lado da residência.
Inari conta que naquele horário não estava mais chovendo. Não tinha trovoadas.
Milhares de frangos morreram afogados
Milhares de frangos morreram afogados na propriedade de Suelen Michel e Rafael Kasper, no bairro Amizade. Durante a madrugada de sábado ainda acionaram uma retroescavadeira para tentar desviar o curso da água, mas, nada pôde ser feito.
“Chamei a retrô, abrimos, e depois deu uma ‘pancadona’ e não deu mais conta de tirar a água. Aí quando vi estava alagado, já era tarde”, conta Rafael.
Os frangos tinham 20 dias. Em junho também tinha entrado água no local mas não havia animais dentro naquele dia, e também a quantidade não foi tamanha como neste final de semana.
Na tarde de sábado, através de uma força-tarefa, tentaram salvaram alguns e levar para outro aviário, que fica nos fundos, e não foi atingido. A estimava é de que cerca de sete mil frangos tenham morrido. O prejuízo é enorme.
Força do Rio Cadeia invadiu moradias
Na Vila Kunst o Rio Cadeia saiu do leito durante a madrugada e invadiu moradias. Os danos foram menores, pois os moradores ainda conseguiram erguer muitos móveis a tempo. Mesmo assim teve estragos.
No sábado o dia foi de limpeza. Havia muita lama.
O nível da água chegou a aproximadamente um metro dentro das moradias.
O local foi fortemente atingido na enxurrada de 2011 e, por isso, há algum tempo fizeram uma contenção na lateral do rio, de forma a desviar, ao menos, a correnteza.
E, se não bastasse a fúria da natureza, uma geladeira que estava de quiosque e que foi arrastada para a rua foi saqueada.
“Eu passei lá de manhã e estava fechada. Depois, quando fui para pegar, as portas estavam abertas e tinham levado produtos de dentro”, lamentou o morador.
Diversas outras residências foram afetadas na cidade, em praticamente todas as localidades.
Desmoronamento atinge fábrica de chocolates
Em Alto Morro dos Bugres, um deslizamento atingiu uma fábrica de chocolates, a Chocolates Cristiane. “Foi horrível, destruiu grande parte do prédio. Um grande prejuízo”, disse Diego Arnold. No sábado se mobilizaram para tentar salvar a mercadoria que tinha no estoque.
“Bens materiais são o de menos, perder vidas é muito triste”
A prefeita Mara Stoffel lamentou por toda a situação que a cidade está enfrentando. “Agora é trabalhar para recuperar tudo. Mas os bens materiais são o de menos, perder vidas é muito triste. São perdas que não temos como recuperar. Nossa solidariedade a todos que foram afetados neste momento e em especial à família Benisch. Que Deus conforte o coração de todos. E seguimos trabalhando para que o mais rápido possível estejamos no nosso normal, pedimos paciência porque estamos dando prioridade às demandas mais graves e subsequente às demais.”
“O caos está em todo lugar do município, de ponta a ponta”
Dezenas de estradas do município foram destruídas. As equipes da Prefeitura estão trabalhando para restabelecer os acessos neste primeiro momento, para, depois, iniciar as manutenções.
O vice-prefeito e secretário e Obras, Gilnei Capeletti, pede a colaboração e compreensão da comunidade. “O caos está em todo lugar do município, de ponta a ponta. Até agora só estamos trabalhando para liberar as estradas, que ainda não estão todas liberadas, nem todos têm acesso.”
Também estão tentando normalizar o abastecimento de água. “Na Renânia vamos conseguir fazer só amanhã, não tem água lá, a enxurrada levou todos os canos, estão por cima, precisam ser enterrados de novo para conseguir fazer as ligações. Então muita paciência, compreensão, vamos precisar de muito tempo para arrumar tudo, muito tempo bom, sem chuva.”
“Fez mais estragos do que em 2011”
A situação está caótica no município. Gilnei afirma que fez muito mais estragos que em 2011. “Daquela vez só pegou um trecho, só que agora fez estragos por tudo. Não tem nem como relatar tudo.”
Gilnei se refere a 2011 pois, naquele ano, uma enxurrada histórica atingiu a cidade, mas somente num determinado trecho entre Padre Eterno Baixo e Centro.
Estrada do Rio Loch, que liga Herval ao Jammerthal, não existe mais
A estrada de Morro dos Bugres que vai para o Jammerthal pelo Rio Loch, está totalmente comprometida.
“A estrada que tinha. Porque não existe mais estrada. E, sinceramente, não sei se ainda vai dar estrada porque foi tudo embora“, disse Gilnei.
Há risco eminente de mais deslizamentos no trecho, portanto, ninguém deve ir ao local.
Calçadão Rio Cadeia, que tinha sido revitalizado, sofreu prejuízos
O Calçadão Rio Cadeia, no Centro, sofreu prejuízos depois que o Rio Cadeia transbordou.
O ponto de entrada da cidade tinha sido revitalizado há poucas semanas. Árvores de Natal que tinham sido enfeitadas pela comunidade também foram danificadas.