Região
“Sem casa, sem trabalho, sem seguro e endividados”
Planos de aposentadoria tranquila de casal de Canoas foram levados pela água da enchente
Por Nicole Pandolfo
Dois Irmãos – Entre os voluntários que organizavam as doações nos fundos da Igreja Luterana (Verde) na última sexta-feira (17), Simone Faturi Silveira Würch, de 55 anos, dobrava e separava roupas que chegavam em sacolas. Ela e o marido, auxiliavam na triagem do material que chega e é direcionado às famílias que perderam suas casas na enchente do início do mês. Diferente da maioria dos que trabalham no local, ela é de Canoas e também foi atingida pela enchente.
“Estou vestido de dois-irmonense!”, brinca o marido. A descontração ajuda a manter o espírito do casal que veste roupas doadas e, enquanto trabalha como voluntário, decide o que fará para dar conta de todas as dívidas que se acumulam enquanto a água não baixa.
O desespero
Moradores do Bairro Rio Branco, Simone conta que, assim que a água começou a chegar na rua, tinha certeza de que o nível não passaria dos 15cm. Na Manhã de sexta-feira (3), a família correu para levantar o maquinário e a mercadoria do chão da ferragem de mais de 400m² que eles administram há 50 anos e que fica na esquina de onde moram. Entre uma ida e vinda até casa de parentes, não conseguiram mais acessar a própria casa, onde os pais de Simone permaneceram, no segundo andar: “Aí o desespero foi até no outro dia, no sábado, quado a gente teve notícia deles. Eles disseram ‘olha, falta três degraus pra água chegar no segundo piso. Pode pedir ajuda pra nos levar.’”
Simone, o marido e a filha adolescente haviam saído de casa com a uma muda de roupa para cada um, com a ideia de que voltariam em poucas horas. Depois de buscar os pais em um abrigo em Canoas, para onde eles foram encaminhados depois de socorridos de Jet Ski e lancha, a família se abrigou na casa de um parente: “A primeira semana foi horrível, a gente estava em vinte poucas pessoas numa casa, sem conseguir organizar nada, não conseguia pensar”, contou Simone.
Mudança de planos
Uma semana depois, conseguiram chegar em Dois Irmãos, onde a família possui um apartamento. Entre uma roupa e outra que Simone separa e organiza, ela diz que ainda não conseguiu assimilar bem o que aconteceu: “Na segunda, a gente já começou a ligar para os fornecedores, pedir mais prazo. Ligar pra RGE, Corsan, Unimed, para as dívidas da gente. Então a gente está sem casa, sem trabalho, sem seguro da loja e endividados.” De Pelotas, a filha mais velha que estuda na universidade federal e mora de aluguel tenta inscrever a família em algum benefício emergencial oferecido pelo governo, mas o cadastro da família esbarra na limitação de renda, que até semanas atrás, era superior ao limite exigido pelos programas.
Sem reservas financeiras, Simone lamenta a mudança brusca de direção que a vida tomou após a enchente: “O plano era trabalhar até os 65, vender a loja… as gurias vão estar formadas…”