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Um mês sem Bárbara: as lembranças que o tempo não apaga
A irmã Estela fala sobre a dor e o amor que permanecem após a partida da professora de moda, morta em acidente na BR-116
Por Cleiton Zimer
São José do Hortêncio / Ivoti | Há um mês, o relógio da noite de 7 de outubro parou para a família Koch. Foi na BR-116, entre Estância Velha e Ivoti, que a professora Bárbara Gisele Koch, 45 anos, perdeu a vida em um acidente que ainda causa incredulidade. O silêncio que se instalou depois daquela noite não foi apenas o da estrada — foi o da casa, o das conversas, o das risadas que marcavam os encontros de família.
Hoje, a irmã Estela Luísa Koch, 43, tenta transformar a dor em memória. “Ainda é muito difícil falar da Bárbara sem chorar… a cada palavra, uma lágrima. A cada lembrança, a dor de saber que viveremos sem a presença física dela.”
Mais do que irmãs, as duas eram grandes companheiras. “Nós éramos muito mais que irmãs de sangue, éramos irmãs de alma. Uma conexão muito forte desde pequenas. Ela era minha melhor amiga, meu porto seguro, minha inspiração. A gente se entendia sem falar nenhuma palavra.”
Onde tudo começou
Nascidas e criadas em São José do Hortêncio, Bárbara e Estela cresceram entre os retalhos de tecido e o som da máquina de costura da mãe, que trabalhava em casa. “A mãe sempre costurou, e a Bárbara, desde cedo, fazia roupinhas de boneca com os retalhos que caíam no chão”, recorda Estela.

As irmãs ainda pequenas, sempre unidas
A infância foi simples, mas cheia de afeto. “A gente aprendeu a valorizar cada conquista. Esses dias lembramos do dia em que nosso pai chegou do trabalho com um picolé pra cada uma. Hoje pode parecer pouco, mas é uma das lembranças mais lindas que temos.”
Dormiam juntas, dividindo sonhos e segredos ditos em voz baixa para que os pais não ouvissem. “Ela fazia carinho em mim pra eu dormir. Mesmo adultas, ela ainda fazia isso, pegava meu braço e repetia o gesto de quando tínhamos seis e oito anos. Era o nosso jeito de dizer que tudo ia ficar bem.”
As duas brincavam de escola. “Nós éramos muito diferentes, ela sempre foi mais tranquila. Eu queria ser a professora. Ela como irmã mais velha cedia. Mas foi ela, durante essas brincadeiras, quem me ensinou a ler.”
Costuras de amor e de vida
A adolescência chegou, mas a união permaneceu. As duas saíam juntas para as festas, jogavam canastra nas noites de sexta-feira e costuravam roupas aos sábados, com a ajuda da mãe, para ir aos bailes. “Nossa mãe cortava o tecido e a Bárbara costurava. Eu ajudava um pouquinho. Era um ritual, um momento de alegria. Nosso pai nos levava pra cima e pra baixo, sempre com orgulho.”
O gosto pela moda e pela dedicação ao que fazia começou ali, entre linhas e tecidos, entre o amor e a rotina da família.
O caminho até a Feevale
Adultas, as duas seguiram seus caminhos, sempre de mãos dadas pela vida. “Eu fui pra educação física, ela começou na pedagogia, mas logo percebeu que o coração dela batia mais forte pela moda.”
Determinada, Bárbara mudou de curso, ingressou em Moda na Universidade Feevale e arrumou um emprego na própria instituição para bancar os estudos. “Ela trabalhava no setor de cópias e estudava à noite. E dizia: ‘Eu ainda vou voltar pra Feevale, mas como professora!’.”
E voltou. Depois de um período lecionando no Senac de Gravataí, realizou o sonho de retornar à Feevale, agora como docente. “Sempre se orgulhava em dizer que aprendeu toda a parte prática da profissão com a nossa mãe. E exerceu sua profissão com maestria!”

Bárbara e Estela se formaram juntas – com uma festa linda.
Um elo que permanece
Os laços de irmandade se renovaram quando vieram os filhos: o filho de Estela, Heitor, em 2017, e o filho de Bárbara, Samuel, em 2018. “O mesmo elo que nós tínhamos, eles têm também. Crescem juntos, brincam juntos. São tão diferentes quanto parecidos. É uma amizade linda, uma continuação da gente.”
Novos sonhos e o futuro que não veio
Nos últimos meses, Bárbara vivia uma fase de alegria e entusiasmo. Havia se mudado para Ivoti no início do ano, para facilitar a rotina do filho na Escola Feevale, e se preparava para lançar uma marca de roupas — a LeBahe, criada com a amiga Helen. O lançamento estava marcado para 18 de outubro de 2025.
“Tinha encontrado uma pessoa que trouxe mais luz pra vida dela, a Helen, que conheceu ao acaso e que acabou se tornando amiga, e embarcaram juntas num sonho.”
Mas a vida foi interrompida de forma abrupta, por uma imprudência que a família ainda tenta compreender. “Por uma irresponsabilidade de alguém que nunca vimos, perdemos a nossa Bárbara. Uma família despedaçada. Sonhos interrompidos.”
O que permanece
Mesmo diante da dor, Estela tenta manter viva a essência da irmã. “Ela era uma mãe protetora e incansável, uma filha amorosa e dedicada, uma irmã companheira e leal, uma dinda divertida, sobrinha/prima alegre e carinhosa, amiga fiel e proativa, uma professora acolhedora e inspiradora, colega de trabalho parceira e responsável. Uma mulher incrível, batalhadora, criativa, determinada e feliz.”
Ela completa: “Ainda custo a acreditar que ela partiu. Sempre seremos nós duas, uma pela outra.”
A investigação
O caso segue sob investigação da Polícia Civil de Estância Velha. O delegado Rafael Sauthier, responsável pelo inquérito, informou que ainda há perícias pendentes para determinar as responsabilidades pelo acidente.
“Solicitamos duas perícias que não haviam sido feitas e estamos avaliando a responsabilidade criminal do motorista, que pode, em algum momento, ter agido com culpa no homicídio dela. Dependemos desses laudos e de mais uma ou outra oitiva”, explicou o delegado.
A polícia não pode informar nomes, mas, a reportagem apurou que o condutor do Chevrolet Cruze que invadiu a pista contrária é Tiago Nunes Wagner, 27 anos, morador de Novo Hamburgo. Ele foi socorrido com ferimentos leves após o acidente. Nenhum contato do investigado foi localizado. O espaço está aberto para manifestações.
