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Vó Hertha Café e Armazém de Nova Petrópolis aparece no New York Times

04/01/2025 - 16h12min

Atualizada em 04/01/2025 - 16h22min

Do lado esquerdo, o famoso café de Linha Olinda. No lado direito, a ,atéria do New Ypork Times que inclui a passagem por Nova Petrópolis

Por Geison Concencia

Um estabelecimento em Linha Olinda, em Nova Petrópolis, chamou a atenção do colunista de um dos maiores jornais do mundo: o New York Times. O jornalista Seth Kugel ia de Gramado a Lajeado, mas durante o trajeto, parou na Vó Hertha-Café e Armazém, localizada às margens da Rua dos Imigrantes. 

Seth diz em sua matéria que não resistiu ao prédio azul-cobalto, de estrutura de madeira e origem alemã, que no passado, era conhecido como Salão Schafer, um antigo salão de festas e eventos da comunidade local, por volta da década de 1970. 

Ao chegar no estabelecimento, além de provar a tradicional cuca, ele também levou uma garrafa de cachaça e um pote de creme. Resultado, a matéria descrevendo a Vó Hertha-Café e Armazém parou no New York Times. Além disso, outro fato chamou a atenção da fotógrafa do jornal, o proprietário Édio Rüchel lendo o seu jornal O Diário. 

A imagem de Rüchel com seu companheiro diário fez parte da matéria publicada pelo jornal americano, além de outras histórias que falam das características culturais da Serra Gaúcha. A matéria pode ser conferida no site do New York Times. 

Em suas palavras, “Eu tinha tropeçado em outro quase-museu, este alemão, alguns dias antes, fora de Nova Petrópolis, a cerca de duas horas de carro ao sul. Não consegui resistir ao prédio azul-cobalto, de estrutura de madeira, rotulado como “Vó Hertha Café e Armazém” — Café e Armazém da Vovó Hertha — mesmo estando atrasado. 

No texto, ele descreve como o café foi instalado sobre o antigo Salão Schaefer, como era conhecido no século XX na Linha Olinda. Ele também destacou o dialeto Hunsrik, falado na localidade. “Quando tentei dizer “bom dia” para Helena Rüchel, que estava no balcão, rapidamente aprendi que não era “Guten Morgen”, mas “Gumoind”. 

O colunista do New York Times aproveitou para saborear a cuca e o café local. Além disso, levou uma cachaça. Seth também narra a história do café, desde que Édio e a esposa Hertha compraram em 2003. 

Depois que Seth visitou o estabelecimento, ele solicitou a fotógrafa Gabriela Portilho, que fosse até o local, fazer os registros, a fim de serem publicados no New York Times. Uma imagem que chamou atenção de Gabriela foi Édio lendo O Diário.  

Colunista aponta semelhanças entre Brasil e EUA 

Em entrevista exclusiva ao Jornal O Diário, Seth descreve sua experiência com o Sul do Brasil e admiração que sente diante da diversidade etno cultural do país. Além disso, reforça a ideia de que tanto EUA quanto Brasil têm traços em comum. 

Diário: o que é mais importante quando tu descreves uma determinada cultura? O que precisa levar em consideração para não cometer erros ao descrever uma determinada comunidade? 

Seth: nesse caso, e em todas as matérias que eu faço, preparo-me muito, encontrando fontes locais. Faço várias entrevistas antes de ir e encontro várias pessoas, até alguns serviram de guias. Tenho que escolher bem essas pessoas. Tem que ler tudo o possível sobre a região e a história, mas também tem que olhar tudo pela lente de alguém nos Estados Unidos, do público. Eu sei, obviamente, o público do New York Times não é só nos Estados Unidos, mas é o principal, então tudo tem que passar por um filtro do que já sabem nos Estados Unidos sobre a sua região do Brasil. Pesquiso muito, aprendo tudo possível, falo com todo mundo, e o que acaba na matéria é uma mínima porcentagem do que vi e fiz. O processo que a gente passa para publicar uma matéria é muito longa e envolve muito checagem de fatos, que não é só dar um Google, mas falar com as mesmas fontes para determinar. 

Diário: pretende voltar para o Sul? 

Seth: em termos de trabalho, é muito pouco provável que o New York Times compre outra matéria minha sobre o Rio Grande do Sul nos próximos meses, mas eu também tenho um canal de YouTube. Também sou um freelancer, em busca de experiências novas no Brasil. 

Diário: além da Vó Hertha, teria outra característica nesse trecho de Nova Petrópolis que despertou a atenção? 

Seth: Sobre a minha visita à Nova Petrópolis, estava deslocando de Gramado para Lajeado, e era só o que eu encontrei no caminho. Acho que parei duas vezes. A primeira vez foi em Santa Maria do Herval, porque vi um berço da cultura de descendentes de alemães. Havia um museu que eu visitei, o Museu Municipal Professor Laurindo Vier. Um bom exemplo de lugar legal que não inclui na matéria do NYT, mas estará no canal do YouTube Amigo Gringo, quando editar.  

Diário: o que mais da culinária alemã/italiana chamou tua atenção? 

Seth: A polenta não é exatamente como a polenta que estou acostumado nos Estados Unidos ou poucas vezes que comi na Itália. Mas é bom apreciar a diferença. Café colonial, com incríveis quantidades de comida, realmente foi bem interessante e uma tradição muito boa. Uma tradição brasileira, uma tradição colonial mesmo. 

Diário: o que representa o Brasil e sua vasta herança cultural? 

Seth: decidi dedicar grande parte da minha vida para conhecer o Brasil, escrever, produzir vídeos. Em parte porque me lembra a diversidade e a riqueza cultural do meu próprio país, Estados Unidos. É um território vasto, com diferenças enormes. Eu já fui para grandes partes do norte, centro-oeste, interior do Paraná, interior de Santa Catarina. E, agora, foi minha primeira viagem para o interior do Rio Grande do Sul, apesar de ter ido várias vezes para Portugal. É por isso que escolhi ficar no Brasil, porque em tudo, não só em cultura, mas em todos os aspectos da cultura e até geografia e natureza, o Brasil tem infinitas possibilidades. 

Em busca de um sonho 

Com 18 anos, ele foi para Caxias do Sul, sem saber falar português. Objetivo era buscar a profissionalização e a realização de seus sonhos. “Fui trabalhar no meio dos italianos. Em um ano, falava mais italiano que português. Depois fui morar em Dois Irmãos. Em seguida, também reside em Novo Hamburgo, trabalhando com vendas”. 

Em 2003, o antigo dono ofereceu a Rüchel a oportunidade para adquirir o estabelecimento. Na época, o preço era de R$ 60 mil pela propriedade de 7 mil metros quadrados. “Nunca achei que poderia comprar isso aqui. Eu tinha um carro para o negócio. Era muito dinheiro, mas pensei para mim, ‘é uma chance única’”. 

Quando compraram, o lugar foi alugado para mercados. O negócio prosperou de tal forma que, aos poucos, eles aproveitaram para também empreender. Em uma mudança, aproveitada pelo conhecimento que a esposa de Rüchel, Hertha, tinha em fazer pães, cucas e bolachas, resolveram abrir um café junto ao mercado. 

Sobre aparecer no NYT, Rüchel acredita ser resultado de sua fé nas oportunidades que a vida lhe proporcionou, as quais ele não deixou escapar. “Eu sempre apostei no futuro, até hoje. O que eu não poderia realizar, as filhas dariam continuidade. É o que está ocorrendo hoje. Estou feliz por alcançar os meus sonhos. Sempre fui muito de sonhar. Nasci muito pobre, criei-me assim. E hoje sou dono da casa que era a mais famosa da Linha Olinda. Estamos muito felizes”, acrescenta. 

Simplicidade que todos buscam 

A filha de Édio, Helena, comenta que o café atrai pessoas que buscam a simplicidade do estabelecimento. A cuca, o pão de linguiça cozido, além do café e ambiente acolhedor, fazem parte de algo que raramente é visto, aproximando as pessoas de um ambiente familiar. 

“As pessoas estavam buscando isso, essa simplicidade, feitas em casa. A vida delas é tão corrida que não conseguem fazer esses pratos mais artesanais. Nosso espaço é simples. Mas as pessoas dizem que é isso que elas querem”, comenta Helena. 

Helena, que atendeu o colunista americano, fala que ficou surpresa e que não esperava a menção no NYT. A gente gostou; e ficamos orgulhosas. Às vezes, não valorizamos tanto, por achar que é um lugar simples, e, mesmo assim, ser tão valorizada. Foi bem gratificante”. 

FOTOS: Geison Concencia

 

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