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Em seu discurso final, Papa Francisco implorou pelo fim das guerras: “quebrem as barreiras que criam divisões”

Jorge Mario Bergoglio, o Papa Francisco, morreu nesta segunda-feira (21), aos 88 anos, no Vaticano. O pontífice argentino, carismático e reformador, liderou a Igreja Católica por quase 12 anos. Sua morte ocorre apenas um dia após a celebração da Páscoa — símbolo maior da ressurreição cristã — e após sua última e emocionante aparição pública, na sacada da Basílica de São Pedro.
O último domingo de Francisco
Neste domingo (20), católicos de todo o mundo se reuniram em oração e emoção na Praça de São Pedro. A esperança era uma só: ver Francisco mais uma vez. Debilitado após uma pneumonia bilateral e uma internação de 38 dias, o Papa apareceu brevemente, com a voz fraca, mas o gesto firme de quem nunca abandonou seu rebanho.
“Caros irmãos e irmãs, Boa Páscoa”, disse Francisco, antes de passar o microfone a um colaborador. A multidão ouviu, então, seu último discurso oficial — uma mensagem pela paz, pelo desarmamento, pela liberdade de expressão e pela superação do medo. Ao final, ele surpreendeu os fiéis ao dar uma volta pela praça em seu papamóvel, acenando e abençoando.
Um Papa inesperado
Nascido em 17 de dezembro de 1936, em Buenos Aires, Jorge Mario Bergoglio era filho de imigrantes italianos. Formado em Ciências Químicas e professor de Literatura, Bergoglio escolheu a vida religiosa ao entrar para a Companhia de Jesus em 1958. Tornou-se sacerdote em 1969, bispo auxiliar em 1992 e cardeal em 2001.
Foi eleito Papa no dia 13 de março de 2013, após a histórica renúncia de Bento XVI. Tornou-se o primeiro pontífice latino-americano, o primeiro jesuíta e o primeiro da era moderna a suceder um papa renunciante. Escolheu o nome “Francisco” inspirado por São Francisco de Assis — símbolo de humildade, paz e amor aos pobres.
Reformador
Francisco iniciou reformas importantes no Vaticano: reorganizou a Cúria Romana, combateu irregularidades financeiras, e incentivou uma Igreja mais acolhedora e próxima dos marginalizados. Seu lema, “Miserando atque eligendo” (“Olhou-o com misericórdia e o escolheu”), refletiu sua missão de evangelização humilde e inclusiva.
Ao longo de seu pontificado, enfrentou tabus e resistências internas. Embora conservador em doutrina, demonstrou abertura em temas sensíveis como a inclusão de pessoas LGBTQIA+, o papel da mulher na Igreja e o acolhimento de refugiados.
Voz da paz em tempos de guerra
Nos últimos anos, mesmo debilitado, Francisco manteve firme sua voz contra injustiças sociais e conflitos armados. Em sua última mensagem de Páscoa, lida por um colaborador, disse:
“Não há paz possível onde não há liberdade religiosa, liberdade de pensamento e expressão”, diz trecho do discurso escrito pelo Papa Francisco para este domingo. O argentino pediu aos líderes políticos que “não cedam à lógica do medo que aprisiona” e que “quebrem as barreiras que criam divisões” e defendeu mais uma vez o desarmamento.
Francisco denunciou neste domingo o que chamou de “dramática e indigna crise humanitária” em Gaza e pediu um cessar-fogo, numa mensagem de Páscoa na qual expressou preocupação com “o crescente clima de antissemitismo que está se espalhando pelo mundo”.
“Faço um apelo às partes em conflito: cessem o fogo, libertem os reféns e prestem ajuda às pessoas que estão famintas e anseiam por um futuro de paz”, declarou o Papa na mensagem lida pelo colaborador.
A saúde fragilizada
Francisco enfrentou um histórico de internações e cirurgias desde 2021. Sua saúde se agravou em fevereiro, quando foi diagnosticado com pneumonia bilateral. Após mais de um mês hospitalizado, recebeu alta em 23 de março. Mesmo assim, fez questão de cumprir alguns compromissos da Semana Santa — inclusive sua tradicional visita a detentos em uma prisão romana.
Neste último fim de semana, não presidiu as missas da Vigília Pascal e da Via Sacra, mas emocionou fiéis ao surgir na Basílica no sábado e, especialmente, ao aparecer na sacada neste domingo de Páscoa — sua despedida silenciosa e simbólica.
O legado do Papa dos Pobres
Francisco deixa uma marca profunda na história da Igreja e no coração de milhões. Sua simplicidade, coragem e humanidade transformaram a imagem do papado. Um líder que optou por viver em uma residência modesta, que usava sapatos simples, que preferia o contato direto com o povo à pompa tradicional.
Ele será lembrado como o Papa dos Pobres, o Papa da misericórdia, o Papa do diálogo — e, agora, como aquele que partiu um dia após a festa da ressurreição.