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A diferença de uma época onde se tinha respeito pela autoridade do professor

11/05/2020 - 19h23min

Noêmia, na Igreja da comunidade Católica de Morro dos Bugres Baixo, conta seu passado (FOTO: Cleiton Zimer)

Santa Maria do Herval – Noêmia Teresinha Moraes Dieter, de 80 anos, é professora aposentada e testemunhou boa parte da história de Herval. Ela nasceu no Rio Loch em 10 de abril de 1940 e, alguns anos depois sua família se mudou para Morro dos Bugres Baixo. Hoje ainda vive na localidade. Ela conta que começou a ir para a aula com sete anos, na escola Machado de Assis (onde hoje fica o salão de Morro dos Bugres), na qual cursou até a quarta série e onde futuramente viria a trabalhar por um período.

Aos 80 anos, Noêmia recorda do seu tempo de magistério em Morro dos Bugres Baixo (FOTO: Cleiton Zimer)

Após isso teve que ir para Dois Irmãos cursar a quinta série, pois naquela escola só tinha até a quarta. “Na época as pessoas não sabiam falar o português direito. Quando cheguei lá acharam que era melhor eu repetir a quarta série para aprender. Então fiz a quarta de novo e depois a quinta; e quando fui para a admissão ao Ginásio tive que estudar em Gravataí”, relembra.

Quando terminou o Ginásio, em meados de 1960, ficou em casa por aproximadamente um ano. “Aí minha prima Romilda Weber, que morava em Estância Velha me perguntou se eu não estava interessada em trabalhar no magistério; no começo eu achei que não conseguiria, por não ter diploma. Mas na época estavam à procura de professores e, então, comecei”, disse ela.

Assim começou a dar aula em 1962 na localidade de Morro do Pedro que pertencia à Estância Velha. Seu pai Eugênio Alfredo Moraes também era professor e, na época, a auxiliou. “Eu comecei dando aula para primeira e segunda série, que eram os mais novos. Mas meu pai me ajudou muito, dando dicas e conselhos”, lembra.

Após três anos lecionando abriram vagas para outros lugares e, então, Noêmia optou por vir para Morro dos Bugres Baixo dar aula junto ao seu pai. “Em 1965 eu comecei a trabalhar aqui, na antiga escolinha. Depois, em 1966 inauguraram a escola Bonefácio de Andrade, construída pelo então prefeito de Dois Irmãos Walter Fleck, e trabalhei lá. Pode se dizer que dediquei todos os meus anos de magistério à essa escola”, disse ela, que deu aula lá até 1988 quando se aposentou e, como não tinha ninguém para substituí-la, permaneceu lecionando até 1996.

Igreja de Morro dos Bugres Baixo em 1914, ao lado esquerdo hoje está o salão e, lá, era a escola onde Noêmia lecionava (FOTO: arquivo Museu Mun. Prof. Laurindo Vier)

Respeito pela autoridade do professor

“Todo começo é difícil, mas naquela época os alunos tinham respeito pelo professor”, ressalta Noêmia, comparando a época em que lecionou aos dias atuais. Ela conta que os pais mandavam os filhos para a escola e o recado era claro: “nessas horas que meus filhos estão contigo, eles são teus. Se eles merecem castigo, pode castigar; e se eles vierem reclamar em casa, o castigo que eles vão receber vai ser em dobro”, conta Noêmia.

Ela conta que hoje a lógica está invertida. “O professor não é mais respeitado e não se pode mais dar castigo. Quando se diz uma palavra a mais eles acham ruim; palmadinha então, nem pensar, que já querem correr na delegacia”, lamenta, dizendo que na época os recursos eram menos, tinha séries multisseriadas, mais alunos mas, mesmo assim, era mais fácil de trabalhar “porque tinha respeito”, ressalta novamente.

Enquanto conversa, ela fala do orgulho em ter sido professora e que tem muitas saudades daquela época. Mas, quando pensa em como as coisas mudaram de lá para cá, se mostra assustada e chega a dizer que não sabe como os professores conseguem dar aula hoje em dia. “Quando a gente pedia silêncio, era silêncio que se tinha. Às vezes eu passo perto das escolas hoje, tem tanto barulho que quase fico tonta só de ouvir do lado de fora. Coitados dos professores”, lamenta.

Ela, que tem 80 anos de sabedoria, analisa que hoje um dos grandes problemas é que “um quer saber mais do que o outro”, e que “os pais ficaram muito diferentes”, disse, defendendo que a educação dos filhos depende de casa. “Muitas vezes a criança vem sabendo e ela acha que pode continuar assim”, destaca.

Noêmia lembra que quando saiu do magistério em 1996 quase não se acostumou a ficar sem dar aula. “Achei que não era possível. De manhã, quando acordava, sempre era aquela correria de já cozinhar o feijão antes de ir para a escola e, depois, quando isso acabou, parecia que ainda precisava disso”, relembra, falando com saudade daquela época.

Hoje, na localidade de Morro dos Bugres Baixo não tem mais escola em funcionamento devido a pequena quantidade de alunos. Os que tem são transportadores para outros escolas do município ou Estado.

Inspirada pelo pai

Professor Eugênio Alfredo Moraes, pai de Noêmia (FOTO: arquivo pessoal)

Eugênio Alfredo Moraes, pai de Noêmia, nasceu em 10 de janeiro de 1913 e faleceu em 2003, aos 90 anos. Até o dia da sua morte foi um grande líder comunitário. Noêmia conta que ele era seminarista, mas, quando estava pronto para ser padre, veio para Morro dos Bugres Baixo. “Aí colocaram ele para ser professor pelo município de São Leopoldo (na época Herval pertencia ao município). Na verdade, ele era de tudo; como não tinha veículos, os padres só vinham uma vez por mês para fazer missa, e tinha que vir no lombo de burros ou cavalos. Então, nos outros domingos meu pai fazia o “onda” para a comunidade”, contou ela. Além disso, Eugênio também era catequista.

“Sempre que faltava alguma coisa, as pessoas diziam ‘vamos no professor Eugênio’, ele vai nos dar umas dicas”, lembra Noêmia. Ela conta que seu pai a ajudou muito no seu início de carreira como professora, sendo uma inspiração para ela.

Uma líder da comunidade

Noêmia casou, teve quatro filhos, dos quais dois estão vivos. Mas mesmo com 80 anos nunca parou de trabalhar e de se dedicar em prol da comunidade. Hoje é uma grande líder, sendo catequista, ministra e organizando a equipe litúrgica.

Além disso, dona Noêmia foi incumbida de dar palestra para os turistas que vem através da Rota Caminhos do Teewald, que é realizado mensalmente em Herval.

Os visitantes são recebidos na Igreja da comunidade, onde ela conta a história de Santa Maria do Herval, falando um pouco da vinda dos alemães que colonizaram a região. Seu filho Roberto, que é presidente da comunidade, sempre a ajuda. “Parar não pode”, diz ela, feliz e cheia de energia.

Para ela a maior riqueza é poder continuar a ajudar na comunidade, não mais como antigamente, mas, conforme o tempo e as condições lhe permitem. “Os jovens, muitas vezes, não conseguem mais pois estudam e tem outros compromissos. Então no que eu puder ajudar, sempre vou estar a disposição”, ressalta dona Noêmia, que nesses dias de quarentena, ia até a Igreja para rezar pela comunidade.

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