Tarifaço de Trump gera incerteza global, derruba mercados e abre brechas para o Brasil

A decisão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de aplicar tarifas sobre produtos importados de mais de 180 países provocou uma onda de incertezas nos mercados globais. Mesmo com a suspensão temporária das medidas por 90 dias, os reflexos do chamado “tarifaço” já impactam o comércio internacional, a confiança dos investidores e setores estratégicos da economia brasileira.

O cenário, segundo especialistas, é de tensão e de oportunidades que exigem organização e agilidade por parte dos países afetados — entre eles, o Brasil.

Incertezas paralisam investimentos e mercados financeiros

As consequências mais imediatas da medida norte-americana foram sentidas nas bolsas de valores, que registraram quedas relevantes desde o anúncio, no início de abril. O principal reflexo, segundo o economista-chefe da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs), Giovani Baggio, é o aumento da incerteza — um fator que paralisa investimentos e compromete o planejamento econômico.

— O não saber o que vem pela frente tem efeitos muito sérios em relação a investimentos e outros movimentos econômicos. Isso é aferido em índices, que já nos colocam em patamares superiores a outras crises — aponta Baggio.

Risco de recessão e mudança no sistema global

O tarifaço também aponta para uma reconfiguração do comércio mundial. Para Baggio, o movimento consolida um novo ciclo de protecionismo que já vinha ganhando força em países europeus e agora encontra respaldo nos próprios EUA — país símbolo do liberalismo econômico. A preocupação maior, no entanto, é com os efeitos colaterais que isso pode causar.

— Sabemos toda a representatividade que a economia americana tem e por isso o medo de que uma recessão por lá se espalhe para o mundo. Com uma recessão nos Estados Unidos, vendemos menos para lá e isso acaba nos afetando via canal de comércio e também com impacto nas moedas, pelo câmbio — explica.

Oportunidades e desafios para o Brasil

Apesar do cenário adverso, o Brasil surge como uma possível alternativa para suprir mercados deixados pela China, que é um dos principais alvos das tarifas americanas. José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), destaca que há espaço para ampliar exportações, especialmente em segmentos onde o país enfrenta menos concorrência direta.

— Oportunidade existe, mas tem que saber atender à demanda que surge — alerta Castro.

Um dos principais entraves à competitividade brasileira continua sendo o alto custo de produção e logística. Segundo a Fiergs, o momento é propício para reorganizar o parque fabril e investir em qualificação e infraestrutura.

— Ficou relativamente “barato” para o Brasil e temos que saber aproveitar. E, para isso, tem que melhorar nossa competitividade de forma ampla — afirma Baggio.

Agronegócio brasileiro ganha espaço, mas sente efeitos do câmbio

O agronegócio, motor da economia nacional, também está no centro das transformações provocadas pela nova política tarifária. A valorização do prêmio da soja, por exemplo, beneficia o produtor brasileiro no curto prazo, como explica Renan Hein dos Santos, assessor da Farsul.

— A China é grande importadora de soja, mas não é viável para eles comprarem dos Estados Unidos com este contexto tarifário, então o Brasil ganha uma grande oportunidade.

Apesar do cenário positivo, o Rio Grande do Sul, um dos principais produtores, sofreu recentemente com uma quebra de safra — o que pode limitar o aproveitamento dessa janela de oportunidade.

Além da soja, milho, carne e até calçados brasileiros podem se beneficiar com a redistribuição dos mercados. A longo prazo, o impacto pode se estender ao setor de biocombustíveis, onde Brasil e EUA são protagonistas.

Por outro lado, a valorização do dólar pode encarecer os custos de produção — especialmente insumos agrícolas cotados em moeda estrangeira — o que exige atenção redobrada do setor.

Fonte: GZH