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MP questiona trâmites de emendas do Plano Diretor de Ivoti

23/08/2019 - 10h10min

Atualizada em 26/08/2019 - 15h30min

Ivoti – O Ministério Público acompanha de perto a sequência da tramitação do projeto de reforma de artigos do Plano Diretor, Código de Obras e Lei de Parcelamento do Solo do município. Ocorre que o MP quer saber se as emendas aos projetos, propostas pela Câmara em audiência pública e aprovadas pelos parlamentares, de fato atendem aos anseios da comunidade.

“Já faz algum tempo que nós começamos a constatar que os interesses não seriam os da comunidade, mas sim privados, que poderiam influenciar na elaboração do novo Plano Diretor. O que vejo nas emendas não me dizem claro que é do interesse da maioria da população”, afirma o promotor de Justiça do MP de Ivoti, Charles Emil Machado Martins.

A participação do órgão Judiciário, neste caso, é novidade durante a tramitação de um projeto de lei. Teoricamente, a proposta de reforma do Plano deveria seguir o rito de qualquer outra proposta vinda do Executivo: a Prefeitura consolida, a Câmara vota, e, caso aprovada ali, vai para sanção ou veto do prefeito Martin Kalkmann.

Tudo isso precisa levar 15 dias, no máximo, ou a proposta volta para ser sancionada pela presidência da Câmara. A diferença aqui é que, com a orientação do MP, o Conselho do Plano Diretor e Urbanismo, criado para auxiliar no projeto, deverá analisar as alterações propostas pelo Legislativo.

MP encaminha ofício para a Câmara

Na segunda-feira, 26, a Câmara aprovou 10 emendas à proposta inicialmente elaborada pela Prefeitura com o apoio do Conselho. O MP expediu um ofício à Câmara questionando a ausência de representantes do Departamento de Planejamento Urbano (DPU), da Prefeitura, na única audiência pública feita no Legislativo, no dia 7 de agosto. Antes, o Executivo havia feito outras três.

O documento é de 9 de agosto, portanto, apenas dois dias após a reunião. Mas se o DPU esteve ausente da audiência, uma presença chamou a atenção, conforme apurado pela reportagem. Trata-se do ex-prefeito Arnaldo Kney, autor do atual Plano Diretor, vigente desde 2014, e sócio de uma imobiliária em Ivoti.

O órgão informa que soube das ausências por meio de um “servidor público municipal que solicitou anonimato”. Também conforme o documento, as alterações, redigidas pela Comissão de Justiça e Redação e aprovadas pelos demais parlamentares, da mesma forma não passaram pela análise de um corpo técnico para verificar sua viabilidade.

Questionado sobre a urgência da expedição do ofício, Charles afirma que queria “evitar uma medida mais drástica”, como a própria suspensão da lei. “Antes que ele [prefeito] sancione e seja mais difícil de reverter, vamos ouvir os técnicos”, comenta o promotor.

Audiência pública para tratar sobre as emendas aconteceu no último dia 7 (Créd. Jonas Soares)

O que diz a presidente da Câmara

A presidente da Câmara, Marli Heinle Gehm (MDB), diz que não foi feito qualquer convite formal ao Executivo, MP ou Conselho, por se tratar de uma audiência pública, mas que houve divulgação na imprensa. “Entendemos que o convite foi aberto a todos. O MP também pediu para nós cópia da ata, filmagem, foi tudo para eles. Fizemos a nossa parte”, comenta ela.

Marli se disse surpresa com o fato de o MP orientar este encaminhamento do projeto ao Conselho. “Nós temos assessora jurídica que acompanhou todo o processo, participou das reuniões com a comunidade, e acredito que estamos dentro da lei”, afirma. A presidente destaca ainda que as emendas foram aprovadas por unanimidade entre os participantes da audiência.

O que diz o prefeito de Ivoti

O prefeito Martin não respondeu sobre supostos “interesses” ditos pelo Ministério Público, mas se manifestou sobre a participação do órgão no processo decisório. “O MP atua como fiscal do processo de revisão do Plano Diretor, desde o início da revisão junto ao Conselho Municipal de Urbanismo, ainda em 2018”, diz ele. Martin confirma que não houve convite oficial para a audiência pelo Legislativo, porém, a Administração e os servidores do DPU tinham ciência da realização dela.

O que diz o relator do projeto no Legislativo

O relator do projeto na Câmara, Satoshi Suzuki, defende as emendas apresentadas pelo Legislativo, e considera que o Conselho já fez a sua parte com relação ao encaminhamento do projeto, defendendo que as decisões a seguir devem ser encaminhadas pelo Legislativo.

“Consultamos pessoas do Conselho, mas não como um grupo, mas como representantes da comunidade. A vez deles passou, agora é com a Câmara” apontou Satoshi. O relator ainda indica que divergências com os conselheiros estavam atrasando o encaminhamento do plano.

“Alguns não se sentiram representados, não concordaram. Procurei o presidente Rodrigo e indiquei que o Conselho estava estagnando o encaminhamento das alterações, porque estava no aguardo do Executivo. Informei então que iríamos votar e aprovar a vontade do povo”, afirmou.

Sobre as suposições de que interesses empresariais estariam sendo considerados para o encaminhamento das emendas, Satoshi concluiu: “Fizemos uma última audiência e é claro que ouvimos os empresários. Eles são fundamentais na arrecadação do ICM. Mas o ouvimos junto com os demais representantes do povo”.

O que diz o presidente do Conselho

O Conselho do Plano Diretor foi criado em 2017, a partir de uma portaria da ex-prefeita Maria de Lourdes Bauermann, que nomeou 17 membros titulares e outros 17 suplentes para analisar as propostas de mudanças. O mandato deles, de dois anos, termina no final deste mês.

O presidente do Conselho, o arquiteto Rodrigo Erhart, concorda com o que nomeia como “intervenção do Ministério Público”, que determinou aos conselheiros a análise da matéria. “Como agente fiscalizador do processo, acho adequado eles se manifestarem naquilo que ele entende que é melhor para o coletivo”, afirma Erhart.

Conforme ele, o Conselho tem uma equipe que analisa tecnicamente as matérias previamente aprovadas. Os conselheiros se reúnem todas as últimas quartas-feiras de cada mês, e a próxima reunião é no dia 28 de agosto. Mesmo com a proximidade do encerramento do mandato, Rodrigo diz acreditar que as emendas da Câmara devam ser analisadas no prazo máximo de 15 dias, antes do retorno compulsório para o Legislativo.

“Se o departamento técnico fazer uma análise preliminar, já que são constituídos para isso, já adianta bastante nosso trabalho. Se daquele pacote todo, as emendas sofreram algum tipo de alteração, em uma hora a gente vai conseguir resolver”, comenta o presidente do Conselho.

Entenda a razão da polêmica

O ponto central da polêmica está na alteração do Plano Diretor sem o posicionamento de técnicos, integrantes do Conselho Municipal, que durante cerca de um ano trabalharam na formulação da matéria. A discussão do momento é o fato da Câmara de Vereadores ter aprovado as dez emendas sem consultar previamente os técnicos da área.

A apresentação e a aprovação das emendas em uma mesma sessão, é o que chama a atenção do Ministério Público. Para o MP as alterações podem estar atendendo a interesses privados. A lei que institui o conselho diz que compete ao grupo opinar sobre projetos de lei e decretos necessários à atualização e complementação do Plano Diretor.

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